15 de nov. de 2016

Os ataques aos direitos sociais: a importância de resistir

por Valdete Souto Severo

Sentimento de impotência
Há um sentimento de impotência que nos paralisa e que transparece no discurso de pessoas que, mesmo preocupadas diante do que está acontecendo em nosso país, não se sentem em condições de reagir. Estão envolvidas com tarefas do dia a dia, preocupadas em poder pagar suas contas ao final do mês, receosas de despedidas sem qualquer motivação, às voltas com empréstimos bancários determinados pelo atraso sistemático no pagamento de seus salários.

A sociedade não está inerte
Os ataques aos direitos sociais vêm de tantos lados, que parece mesmo impossível resistir. O último dia 09 de novembro provou, uma vez mais, que esse é um pensamento equivocado. O processo em que se discutia a possibilidade de terceirização ampla e irrestrita e, pois, a iminente possibilidade de chancela, por parte do STF, para a destruição da espinha dorsal do Direito do Trabalho, com o peso simbólico e real da repercussão geral, não foi colocado em pauta. Trata-se de resultado de uma luta incessante, feita de pequenos gestos, de muito trabalho, de muito diálogo e de coalisão entre movimentos sociais e associativos, centrais sindicais, estudantes e trabalhadores brasileiros. A sociedade não está inerte. No dia 09, vários atos foram realizados em defesa do Direito do Trabalho. A pauta geral que tem sido identificada pela expressão “nenhum direito a menos” vem unindo cada vez mais as chamadas “forças de esquerda”, e começa a obter alguns resultados.

Há greve geral designada para amanhã, 11/11, e envolve, como nos bons tempos da luta sindical do início do século passado, vários segmentos sociais, unidos pelo objetivo comum de resistir para avançar.

Aliás, é apenas porque a sociedade está alerta e atuante que projetos de lei como o PLC 30 ainda não foram aprovados. Em todas as audiências públicas realizadas para a discussão desse projeto, restou nítida a inconformidade dos mais diferentes setores da sociedade, para com o texto que pretende a ampliação sem freios de uma “técnica” de contratação que não tem outra finalidade do que reduzir custos, retirar responsabilidade e suprimir direitos. Esse movimento de resistência une, em realidade, todos aqueles que estão na luta para que o arremedo de Estado Social conquistado com a Constituição de 1988 não seja completamente desfigurado. E mesmo abafado pelos meios de comunicação da grande mídia, não para de crescer.

A luta contra a PEC 241
São várias as frentes de batalha. Lutar contra a PEC 241 talvez seja o que melhor simboliza a resistência contra esse movimento de desmanche, que poderá implicar, de maneira concreta e real, o fechamento de postos de saúde, a privatização de escolas e hospitais, e o fim da Justiça do Trabalho.

Além de reduzir gastos com educação e reformular o ensino médio, propondo uma aprendizagem direcionada, em que nossos filhos sejam desde cedo “selecionados” para servir ao capital ou ao trabalho, o atual governo pretende legitimar o discurso da privatização, que já vem sendo enunciado há algum tempo. Claro, pois sem recursos não há como manter faculdades, hospitais ou escolas funcionando. O resultado concreto dessa inversão de valores será a redução de um número significativo de pessoas a condições desumanas. Pessoas que não tem o mínimo de condições dignas para existir e que, por consequência, nada tem a perder. Para os quais o Estado simplesmente deixará de existir. Sequer se reconhecem como cidadãos que participam das escolhas políticas da sociedade em que vivem. E realmente estão à margem, enfrentam as filas dos postos sem qualquer atendimento, passam horas em meios de transporte superlotados onde são tratados como animais, temem tornar à casa á noite, porque sabem que não segurança nas ruas. Essa realidade, que – é bem verdade – já existe para muita gente, será potencializada com a drástica redução dos investimentos em áreas essenciais para que não se instale o caos.

PLC 30
O PLC 30, secundado pelos processos que versam sobre terceirização e que estão sendo pautados pelo STF, complementam esse quadro desolador. A permissão para a terceirização ampla e irrestrita, a redução do orçamento da Justiça do trabalho e a ausência de reposição dos quadros de servidores e juízes irá impor, em bem pouco tempo, o fechamento das portas desta Justiça Especializada que, como sabem todos os trabalhadores brasileiros, é o único local em que ainda há espaço para a discussão e a concretização de direitos fundamentais trabalhistas.

Somos responsáveis pelo rumo do país
Essas batalhas parecem maiores do que nós, mas não são. Já enfrentamos a escravidão, e toda a retórica que a defendia; já enfrentamos o Estado Novo e a ditadura militar. Com pequenas vitórias e muita persistência, superamos o discurso do fim da história e, com ela, da Justiça do Trabalho, que imperava na década de 1990. Essa é apenas mais uma etapa a ser vencida. A história não é algo que ocorre lá fora, à revelia da nossa vontade, cada ser humano é responsável pela construção da realidade ao seu redor e é a união, a teimosia, a resistência e a luta que determinarão os rumos dos próximos anos em nosso país.



Valdete Souto SeveroValdete Souto Severo é Articulista do Estado de Direito – Doutora em Direito pela USP/SP, professora e diretora da FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho do RS, membro do grupo de pesquisa da USP Trabalho e Capital, Juíza do Trabalho.

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