Foto Joaquim Dantas |
Para o colunista Alex Solnik, a entrevista do ministro Jaques Wagner à Folha, em que admite que o PT "se lambuzou" com a velha política e que o governo vai "enterrar o impeachment", é uma prova de que "agora o Planalto já tem uma voz para contrapor à do presidente da Câmara, [Eduardo Cunha] que atravessou 2015 vendendo a impressão que mandava mais que a presidente da República"; Solnik criticou a atuação do antecessor de Wagner, Aloizio Mercadante, e disse que Dilma "demorou a perceber que estava levando bola nas costas"; "Ela tem agora um escudo que sabe defender, sabe atacar e sabe dar manchetes aos jornais. Wagner não só tem a língua afiada e ferina como também sabe agir nos bastidores, por isso sua afirmação de que o governo ganha com mais de 257 votos a queda de braço do impeachment é factível"
Por *Alex Solnik
No Brasil 247
A entrevista de Jaques Wagner à "Folha" de hoje é um divisor de águas. Claro que o jornal escolheu a manchete preferida na sua batalha para destruir o partido no poder – "O PT se lambuzou" – e não a mais jornalística – "Vamos enterrar o impeachment" – mas, de qualquer maneira, a boa notícia para o governo é que agora o Planalto já tem uma voz para contrapor à do presidente da Câmara, que atravessou 2015 vendendo a impressão que mandava mais que a presidente da República.
Na teoria e na prática é impossível Cunha ter mais poder que Dilma, mas era a impressão que os jornais passavam - e a versão é mais forte que a realidade - não só por terem ojeriza ao PT, mas porque vivem de manchetes e Cunha é um especialista nisso. Suas entrevistas sempre dão lide. Ele não faz média. Suas ações, sem entrar no mérito, resultavam em manchetes bombásticas do tipo "a Câmara derrota mais uma vez o governo"; "isso eu não aceito"; "o governo quer jogar a corrupção no colo da Câmara"; "eu sou oposição ao governo" que fragilizavam ainda mais a presidência da República.
Ele passou o ano dizendo esse tipo de coisa e ainda por cima empunhava a espada de Dâmocles que era o impeachment em cima da cabeça da presidente. É evidente que a presidente não podia perder tempo batendo boca com Cunha o dia inteiro todos os dias porque precisava governar e não tinha ninguém no seu entorno para cumprir esse papel. Deveria ser tarefa do Aloisio Mercadante, mas, convenhamos, ele nunca teve poder para isso, principalmente depois que lhe pespegaram o apelido de "Fred Mercury".
Era a crônica da derrota anunciada. Cunha batia e Mercadante caía nocauteado. Seu episódio mais ridículo foi aquele em que, logo no início d segundo mandato, telefonou para Cunha comunicando a demissão de Cid Gomes, ministro da Educação por ter chamado Cunha e seus parceiros de achacadores no plenário da Câmara. Mercadante não só comunicou a ele como também o autorizou a anunciar a demissão. Foi a pá de cal na sua autoridade. E uma bela turbinada no poder de Cunha, pois a leitura foi que quem derrubou o ministro tinha sido ele. Se quem derruba ministro é presidente da República e ele derrubou ele é tão poderoso quanto o presidente da República.
Em outras palavras, Mercadante perdeu, naquele dia, seu poder e o entregou ao maior desafeto do governo. Foi o primeiro sinal à sociedade de que Cunha tinha muito poder. Ou seja, o homem forte, que deveria proteger Dilma dos poderes de Cunha deu mais poder a Cunha.
Dilma demorou a perceber que estava levando bola nas costas, somente no segundo semestre trocou Mercadante por Wagner, mas dessa vez acertou. Ela tem agora um escudo que sabe defender e sabe atacar e sabe dar manchetes aos jornais – embora nem sempre sairá a que ele gostaria. Wagner não só tem a língua afiada e ferina como também sabe agir nos bastidores, por isso sua afirmação de que o governo ganha com mais de 257 votos a queda de braço do impeachment é factível.
Não bastam, no entanto, a retórica e o talento de negociador de Wagner. Como já dizia Maquiavel, em "O Príncipe", a maior defesa contra qualquer conspiração é o apoio popular:
Um dos mais poderosos remédios de que um príncipe pode dispor contra as conspirações é não ser odiado pela maioria, porque sempre, quem conjura, pensa com a morte do príncipe satisfazer o povo, mas, quando considera que com isso irá ofendê-lo, não se anima a tomar semelhante partido, mesmo porque as dificuldades com que os conspiradores têm de se defrontar são infinitas. Por experiência vê-se que muitas foram as conspirações mas poucas tiveram bom fim, pois quem conspira não pode ser sozinho, nem pode ter por companheiros senão aqueles que acredite estarem descontentes; mas, logo que tenhas revelado a um descontente a tua intenção, lhe dás motivo para ficar contente porque, evidentemente, ele pode daí esperar todas as vantagens; de forma que, vendo o ganho certo de um lado, sendo o outro dúbio e cheio de perigo, é preciso seja ou extraordinário amigo teu ou implacável inimigo do príncipe para manter-te a palavra empenhada. Para reduzir o assunto a termos breves, digo que do lado do conspirador não existe senão medo, ciúme, suspeita de castigo que o atordoa; mas, do lado do príncipe, existe a majestade do principado, as leis, as barreiras dos amigos e do Estado que o defendem; consequentemente, somada a tais fatores a benevolência popular, é impossível exista alguém tão temerário que venha a conspirar.
*Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão", "O domador de sonhos" e "Dragonfly" (lançamento janeiro 2016).
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