24 de jan. de 2012

Relato sobre a Reintegração de Posse no Pinheirinho



Por Paloma Franca Amorim
São Paulo, 22 de Janeiro de 2012
Acabei de voltar de São José dos Campos onde vivi uma das piores situações da minha vida.
Fomos para o bairro do Campo dos Alemães, entorno da ocupação do Pinheirinho, para tentar registrar como estava a situação posterior à reintegração de posse que ocorreu esta manhã de domingo na comunidade do Pinheirinho.
Chegamos com nossas câmeras para tentar filmar e dar apoio às famílias que perderam suas casas e encontramos diversas tendas armadas pela prefeitura e pelo governo que seriam usadas para cadastrar os moradores do Pinheirinho, de modo a oferecer-lhes alguma ajuda depois da truculenta reintegração.
Filmamos os tratores na área de entrada do Ṕinheirinho (a qual não fomos autorizados a entrar pelo cordão de isolamento da polícia militar – que fazia parte de um contingente de mais de  MIL policiais na área). Depois de cinco minutos bombas e tiros foram disparados contra todos nós (nós estrangeiros e eles moradores) que estávamos na área reservada para o recadastramento e apoio aos moradores. Mais de 400 famílias dentro das tendas tiveram de correr para fora da área para que não fossem atingidas pelo ataque da polícia (eu tenho tudo isso gravado e divulgarei amanhã pela manhã).
Crianças chorando e adultos desesperados por estarem expostos à força LETAL da polícia e por entenderem que este cadastramento não significava nada na medida em que seus pertences estavam sendo tratorados junto com suas casas no mesmo momento em que o governo de São Paulo e a prefeitura de São José dos Campos prometeram que todos os reaveriam após tal trâmite burocrático. Isto é, segundo o acordo do governo e da prefeitura, os moradores do Pinheirinho poderiam voltar para suas casas para buscar seus bens (aparelhos domésticos, móveis, roupas…) após realizarem a assinatura de alguns termos. Tenho depoimentos de pessoas indignadas e desesperadas por entenderem que além de suas casas, também tinham perdido o que estava dentro delas.
A polícia fez um cerco, não havia por onde fugir. Crianças e velhos aspirando e tossindo e chorando e exalando aquele terrível gás lacrimogêneo e de efeito moral (que pode ser uma arma letal, como foi para uma criança de apenas três anos que veio a falecer na ação da PM); alguns grupos de moradores apedrejavam as viaturas policiais em resposta e foram atingidos por balas de borracha e, garanto, por balas de chumbo. Ambulâncias do SUS começaram a chegar para atender aqueles que se mostravam debilitados diante de tal ataque. Mães correndo com seus filhos nos braços. Mães correndo sem seus filhos nos braços.
Tentaram confiscar nossas câmeras, a minha escondi num sobretudo com bolsos.
Isso tudo com muito, mas muito medo.
As tendas armadas pela prefeitura e pelo governo, portanto, foram armadilhas para aglomerar e agredir famílias indefesas que estão há 7 anos ocupando o Pinheirinho, massa falida que só está neste momento sendo reivindicada em função da especulação imobiliária tão contundente nos últimos tempos no estado de São Paulo (vide a Cracolândia na Nova Luz).
Quando estávamos saindo um grupo da comunidade do entorno pôs fogo em mais um carro (o sétimo ou oitavo que vimos até então). A guerra civil foi declarada.
No sindicato dos metalúrgicos estão acontecendo reuniões sobre a situação, focadas fundamentalmente nas ações jurídicas que poderão reverter os acontecimentos. Estivemos lá também.
Um fato: Alckimin, nosso governador, é um facínora, maior responsável político pelos acontecimentos.
Um representante do Governo Federal esteve no momento de reintegração de posse e levou um tiro de bala de borracha. O comandante da ação tomou ordem de prisão e não parou de comandar o batalhão da PM para que a liqüidação dos habitantes do Pinheirinho continuasse. A organização paramilitar da polícia anuncia um golpe militar.
As pessoas continuam na rua.

Crianças cheias de gás de pimenta andando pra lá e pra cá (um menininho não tinha roupas para vestir pois todas elas estavam inutilizáveis por conta de tal gás).
São quase três da manhã e eu garanto a vocês que pessoas anônimas morreram e morrerão.
Eu sou professora, acredito nas crianças como futuro deste país… que condições enquanto sociedade oferecemos a estes pequenos do Pinheirinho ficando calados e, portanto, coniventes, com este lastimável evento?
Em que condições vivem as pessoas idosas do Pinheirinho que construíram, no seio da desigualdade social, a história deste país??
Onde será empenhado o vigor destes jovens que também lá viveram?
Morte de mãe não é nada diante disso. Boa noite a todos.”
Escrevo para divulgar os acontecimentos e peço que compartilhem se for possível, pois a mídia não tem exibido a verdadeira situação dos moradores do Pinheirinho e do entorno. Hoje houve mais um confronto e descobriu-se que os hospitais não estão divulgando o número de mortes por ordem do prefeito de São José dos Campos. Também soubemos que crianças foram assassinadas pelos tiros de borrachas da PM e pelas bombas de efeito moral.
O que houve em São José dos Campos foi uma chacina que não pode ser ignorada.

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