23 de fev. de 2013

Yoani Sanchez, uma blogueira incomum

Yoani Sanchez, uma blogueira incomum

Por LOLA ARONOVICH
Via escrevalolaescreva
Pô, gente, vocês, hein? Muita gente me pedindo pra falar da Yoani Sánchez... Eu não quero falar sobre tudo, não tenho opinião e muito menos tempo pra falar sobre tudo! Mas, já que vocês insistem, lá vou eu irritar um montão de gente.

Nunca tinha entrado no blog da cubana (Generación Y) antes de ontem. A primeira coisa que me chamou a atenção é que dá pra escolher a língua em que você quer ler o blog. Entre as opções, há nada mais, nada menos que vinte (20!) línguas, fora o espanhol. Não conheço nenhum outro blog ou site com tantas traduções. Creio que nem o site da Nações Unidas esteja disponível em 21 línguas! É o primeiro indício de que não estamos diante de um blog comum.
Parece que o blog, que faz oposição ao governo cubano e existe desde 2007, recebe cerca de 10 milhões de visitas por mês (é o que ela diz, e a verdade é que muitos blogueiros exageram sua audiência; 10 milhões parece demais, sendo que o site do New York Times, um dos maiores do mundo, tem 17 milhões por mês), a enorme maioria de fora de Cuba. E Yoani ganhou 200 mil dólares em prêmios variados dados ao blog nos últimos três anos, o que deve fazer dela a blogueira mais rica do mundo. Só pra efeito de comparação, meu humilde bloguinho, que está quase alcançando a incrível média de 300 mil visitas por mês, me rendeu 6 mil reais em seus cinco anos de vida. E isso tudo veio de leitorxs.
Não obstante, eu vivo sendo acusada pelos meus inimiguinhos (machistas de extrema direita, em sua maioria, e alguns hipsters que se dizem de esquerda, mas acho que não têm certeza) de ser financiada pelo governo. Não sei qual o interesse do governo Dilma (que sequer sabe da existência deste blog) em dar dinheiro prum blog feminista que não está necessariamente pulando de felicidade com a atual administração no que concerne avanços nos direitos humanos, mas, enfim, seja lá o que estão me pagando, faz muito tempo que não recebo. Tipo, uns cinco anos.
Acho que faz parte das nossas teorias conspiratórias pensar que as pessoas mantém blogs por dinheiro, e não por ideologia. Minha opinião é que é quase impossível ganhar grana com a internet, porque as pessoas (eu inclusa) estão acostumadas a ver e partilhar conteúdo sem gastar nada, e porque possíveis anunciantes (vou usar a palavra ainda, pra parecer otimista) ainda não levam a net a sério e continuam enviando pra blogueirxs emails do tipo “coloque o banner da nossa empresa no seu blog e ganhe divulgação”.

Mas o fato é que a Yoani tem recebido um dinheirão com o blog. Por exemplo, um prêmio concedido pelo jornal espanhol El País lhe rendeu US$ 15 mil dólares. Suponho que, pra você premiar um blog, é porque você gosta daquele conteúdo, não? Ou alguém consegue imaginar uma igreja, supondo que igrejas premiam blogs, condecorando este bloguinho que vos fala?
Yoani está sempre no topo. A Time a incluiu numa lista das cem pessoas mais influentes do planeta. Nem Raul nem Fidel Castro estão na lista, o que faz supor que a Time considera Yoani mais influente que eles. Meio estranho, vai. Ok, sejamos francos: é ridículo. Sem falar que há uns onze documentos do Wikileaks mostrando conexões entre ela e alguma instituição (CIA, cubanos exilados em Miami etc) ansiosa pra que os Castro morram e Cuba passe a ser novamente o cassino dos americanos, que foi até 1959.
A meu ver, o maior erro em qualquer análise sobre Yoani e Cuba é fingir que tudo isso nada tem a ver com ideologia. Nessas horas, o pessoal que insiste que não existe mais direita e esquerda, que essas designações são coisas do passado (e 99% da galera que diz isso é de direita), deve corar de vergonha. Se não existisse esquerda e direita, a gente nem estaria falando de Yoani, nem as posições políticas de cada pessoa que se manifesta estariam tão evidentes. Claro que há várias gradações de esquerda e direita. Tem muita gente de esquerda no Brasil (estou nessa turminha) que pensa que dar tanta atenção a Yoani é justamente promovê-la. 
E tem gente que acha imprescindível ir protestar com faixas e palavras de ordem a chegada de Yoani a aeroportos e aos eventos marcados. Não acho que estejam errados. Cada um tem sua forma de pensar e lutar. Só erram quando apelam pra violência (parece que alguém puxou o cabelo de Yoani).
A direita tampouco é um bloco só. Yoani foi convidada a vir ao Brasil por um diretor de cinema que a entrevistou para seu documentário sobre Cuba e Honduras. 
Este diretor faz parte do Instituto Millenium, uma organização de direita muito bem financiada. Óbvio que nossa mídia tradicional, nas mãos de uma dúzia de famílias milionárias, que defendem unicamente seus interesses e por isso são contra qualquer movimento popular, vai dar o maior destaque possível a tudo que o Yoani disser. Mas o pessoal de extrema direita (aquele que pensa que Folha, Globo e até Veja são de esquerda!) afirma que Yoani é uma agente comunista criada pelo governo cubano para chamar a atenção e tirar o foco dos verdadeiros presos políticos da ilha.
Que o governo cubano tem responsabilidade na promoção de Yoani, não há dúvida. Ela teve negada a saída de Cuba vinte vezes, o que não faz sentido nenhum. Se você tem uma ditadura e lá dentro tem gente falando constantemente mal do regime, e essa pessoa pede pra ir embora, pelo menos tempoariamente, o mais inteligente a se fazer é indicar-lhe a porta de saída e dizer “Não tenha pressa em voltar, fique longe o quanto quiser, por favor”.
Yoani, inclusive, viveu na Suíça entre 2002 e 2004, e pode apostar que ela não teria o destaque que tem se não fosse uma opositora dentro de Cuba. Ela é inteligente e sabe disso. Tanto que um jornalista agora no Brasil lhe perguntou o que ela faria se Cuba não permitisse sua volta, e ela respondeu que pegaria um barquinho e seria a primeira a invadir Cuba, em vez de deixá-la (Yoani parece nunca ter ouvido falar na famosa invasão da Baía dos Porcos, em 1961, em que um grupo patrocinado pelos EUA tentou invadir Cuba, e foi fragorosamente derrotado, num dos episódios que mais devem dar vergonha a CIA -– e olha que são muitos).
Eu, como a maior parte das pessoas de esquerda, tenho um carinho especial por Cuba. Acho incrível que Che Guevara, Fidel e outros revolucionários tenham conseguido derrubar Batista, um ditador-fantoche mantido pelos EUA. E algum dia vão fazer um filme de como Fidel foi capaz de sobreviver durante cinco décadas (imagina quantas vezes a CIA não tentou matá-lo?). Cuba é um caso único no mundo de um paisinho que peitou o maior império de todos os tempos, e só isso já deveria ser motivo de orgulho. E, apesar do bloqueio americano, que completou meio século no ano passado, apesar da queda de uma aliada poderosa, a União Soviética, apesar de toda a pobreza, Cuba continua se destacando em educação e saúde.
O problema é que substituir uma ditadura de direita por uma de esquerda não é a solução. E personalizar o poder, como fez Fidel, faz com que Cuba seja Cuba apenas enquanto ele viva. Depois da morte dos Castro, quanto tempo levará para que o sonho cubano acabe? Eu não tenho muita esperança, não. Infelizmente, acho que Cuba voltará a ser o destino de veraneio de americanos ricos logo logo. E, assim que isso acontecer, Yoani perderá todo seu patrocínio. Toda a sua razão de ser.

2 comentários:

Anônimo disse...

O programa Canal Livre da Band TV recebeu a blogueira cubana Yoani Sánchez em São Paulo. A entrevista aconteceu nos estúdios da Band.
A entrevista contou com a tradução simultânea da Millennium, feita do espanhol para o português e vice-versa. A entrevista pode ser acessada através do link: http://canallivre.band.uol.com.br/?id=14300255

Blog do Arretadinho disse...

Prezado anônimo, obrigado pela contribuição. Volte quando quiser. Saudações fraternas