21 de jan. de 2014

Rolezinho: O hiato social?

Rolezinho: O hiato social?
De Brasília
Joaquim Dantas
Para o Blog do Arretadinho

Hiato tem origem no termo Latim “hiatus”, cujo significado é “abertura, fenda, lacuna”, abrangendo diferentes conceitos e aplicações.

De acordo com a linguística, hiato é o encontro de dois sons vocálicos cujas vogais são separadas na divisão de sílabas. São necessários dois esforços de voz para pronunciá-las, ao contrário do ditongo em que há um único esforço de voz e as vogais permanecem na mesma sílaba.
  • Em anatomia, dá-se o nome de hiato a uma fenda, uma abertura ou um orifício no interior do corpo humano. Por exemplo: hiato de Falópio, uma pequena abertura na face superior do osso temporal; hérnia de hiato, caracterizada pela passagem de parte do estômago para o tórax através do orifício do diafragma (também denominado hiato esofágico).
  • Em geologia, o hiato está relacionado com o conceito de discordâncias, que são superfícies que dividem duas rochas com idades distintas, sabendo que houve um intervalo de tempo (hiato) na formação de ambas. Neste caso, o hiato é verificado quando não acontece a sedimentação de alguns elementos.
  • No sentido figurado, um hiato representa uma falha, uma lacuna. Pode ainda ser definido como uma interrupção entre dois acontecimentos.
Os recentes chamados rolezinhos, proporcionados inicialmente por jovens da periferia de São Paulo, não é um fato novo no Brasil. Em Agosto de 2000 um grupo de Sem Tetos do Rio de Janeiro resolveu dar um rolé no Shopping Rio Sul, causando pânico em frequentadores e lojistas.

O interessante é que o grupo de Sem Tetos era formado por donas de casa com seus filhos no colo e seus maridos ao lado, além de alguns adolescentes e idosos. Todos Pobres, vestidos de forma simples, a maioria eram negros e estavam ali apenas para conhecer aquele espaço de luxo, tão distante da realidade de cada um deles.

O diretor Vladimir Seixas recuperou imagens e fez um documentário sobre esse inusitado rolezinho que repercutiu, na época, na imprensa nacional e internacional.
No curta a Professora de comunicação Ivana Bentes analisa que aquelas pessoas fizeram uma coisa normal, como pegar um ônibus com a família e ir a um Shopping, "uma banalidade comum". Mas, na realidade desse hiato social, essa banalidade produziu cenas de pânico, porque pessoas de um outro grupo social resolveram atravessar uma barreira invisível.

A decisão daquelas pessoas em se mostrarem como são, pobres, negros, de um grupo social completamente desconexo daquela realidade luxuosa, é mais que uma provocação, é uma denúncia de quanto o capitalismo é maléfico para a maioria da sociedade. A ONG Oxfam Intermón, publicou recentemente que  85 bilionários somam o equivalente à renda de 3,570 bilhões de pessoas pobres, metade da população mundial.

Uma cena maravilhosa é quando aquelas pessoas ocupam a praça de alimentação do Shopping e comem pão com mortadela, distribuído pelos organizadores. Um tapa na cara do consumismo!
Nessa cena o recado é claro, muitas pessoas sobrevivem sem aqueles restaurantes. Sócrates deve estar aplaudindo eles até agora. Quando vi a cena lembrei na hora do "passeio socrático" que Frei Betto definiu tão bem quando de uma ida sua a um Shopping: 
"Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer de uma cadeia transnacional de sanduíches saturados de gordura… 
Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas:
 “Sócrates, filósofo grego, que morreu no ano 399 antes de Cristo, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: “Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz.”

Que venham mais rolezinhos, que possamos extinguir o hiato que separa pessoas de pessoas.
Assista, vale a pena!



Prêmios
Melhor documentário pelo Júri Oficial do 2º Cinema com Farinha
Entre os dez mais votados na 3ª Mostra Curta Audiovisual de Campinas pelo Júri Popular
Melhor Documentário pelo Júri Oficial do 2º Perro Loco
Melhor Filme pelo Voto Popular do 2º Perro Loco
Melhor Direção no 4º Curta Canoa
Melhor Documentário no 7º Festival de Vídeo Estudantil e Mostra de Cinema | Guaíba, RS
Prêmio Curadoria no 2º Festival de Curtas Metragens de Direitos Humanos | Entretodos
Melhor Filme pelo Júri Popular no 4º no FestAruanda
Melhor Filme no 1º Festival do Júri Popular na cidade de Lençóis | BA
Melhor Documentário pelo Júri Popular na 5ª Mostra Audiovisual de Cambuquira
Prêmio Machado Bittencourt Especial do Júri no Comunicurtas 2009
Melhor Documentário no Comunicurtas 2009

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