Por Renato Soares Bastos*
no sítio Contee
Não há quem negue que a partir do primeiro governo Lula tem-se uma mudança significativa na configuração do Estado brasileiro.
Mais lenta em seu início, ganha certa velocidade após o evento conhecido como “mensalão” e, principalmente, após o segundo mandato. Com a eleição e reeleição de Dilma tal reconfiguração se mantém. Pode-se dizer que estivemos diante de dois retornos, ainda que incompletos: a recomposição do Estado, esvaziado pela década neoliberal, e a reconstrução de um projeto nacional de desenvolvimento. É contra esses processos que acontece o golpe.
Há que se afirmar também que tanto com Lula como com Dilma esse processo de mudança estatal é marcado por contradições. Devido a limites impostos pelo capital, nacional e estrangeiro, e por convicções do próprio governo, medidas tomadas contrariaram os cânones históricos da esquerda sobre o tema. Por outro lado, ao largo do tempo um conjunto de ações proporcionaram alterações significativas, e que foram alvo constante dos setores conservadores e neoliberais, possibilitando se falar de recomposição do Estado e do vislumbre de um projeto nacional de desenvolvimento. Enfim, pode-se falar nos “retornos”.
Antes, porém, de se detalhar os limites e avanços das gestões progressistas, e as últimas que estão sob ameaça e dão causa ao título do artigo, cabe – nos limites desse texto – uma síntese da evolução do Estado brasileiro que nos possibilite o entendimento da ideia de retorno.
Até a década de 30 é difícil pensarmos na existência de um Estado como temos hoje. Com a independência, permanecemos um país exportador de matéria prima, dominado por uma elite agrária que mantinha para si o domínio político e tendo a figura do monarca como mediador de seus interesses. O advento da República gera uma distribuição de poder, que fortalece os líderes locais, mas que não chega a configurar um novo projeto de Estado. Continuamos sendo exportadores e dotados de um aparelho estatal fraco, minguado e com pouca interferência nas questões sociais, para além da face repressora. É um Estado liberal, adequado à realidade dos trópicos.
Com Vargas e a Revolução de 30 começa a construção de um Estado forte, soberano e desenvolvimentista. A caracterização desse desenvolvimentismo é longe de ser consensual, inclusive a discussão a partir do referencial Weberiano de burocracia estatal. Mas é claro que tem-se a criação de uma série de serviços estatais, a interferência nas questões sociais – as criações do Ministério do Trabalho, da CLT e da Justiça do Trabalho são bons exemplos – e uma profunda participação do Estado na economia, seja como regulador, financiador ou empresário, lançando as bases para a industrialização e modernização do Brasil.
Essas características persistem após a queda da ditadura de Vargas e o interregno do Governo Dutra. O segundo governo do ex-ditador, agora eleito, finca definitivamente as indústrias de base no país, Juscelino Kubistchek implementa seu ousado Plano de Metas – com destaque à construção da nova capital e a implementação das indústrias de bens duráveis – e o governo de João Goulart se vê diante dos desafios das reformas de base que propiciariam a democratização e a diminuição das disparidades da sociedade brasileira.
O Golpe Militar, assim como o golpe atual, vem para interromper essas políticas nacionalistas de fortalecimento da soberania do Estado, a democratização do mesmo e da sociedade e o desenvolvimentismo em curso. Contudo, os militares interrompem em parte o processo. Sob uma ótica conservadora e reacionária de “Brasil Potência”, o Estado continua a ser fortalecido, inclusive a sua interferência na economia pela manutenção das estatais e a criação de inúmeras outras, além da indução ao desenvolvimento. Inúmeras foram as concessões ao capital internacional e aos capitalistas brasileiros – a troca da estabilidade decenal pelo FGTS, por exemplo – e o crescimento da economia não foi distribuído, mas o Estado na Ditadura Militar está longe de ser mínimo e liberal.
Com o processo de democratização resgatam-se os sonhos de transformação do Brasil e a Constituição de 1988, dada a ascensão dos movimentos sociais, é representativa desse modelo de Estado desejado. É uma carta constitucional dirigente que consagra em seu texto inúmeros direitos sociais que visam tornar o Brasil quase um Estado Social-democrata, pelo menos no papel. A luta seria para fazer valer os dispositivos constitucionais, não fosse a eleição de Fernando Collor e o início da implementação do neoliberalismo.
O governo Collor é um fracasso econômico e político. O impeachment de 1992 – com crime de responsabilidade – coloca fim a essa experiência neoliberal inicial. Abre-se um interregno com Itamar Franco até a chegada de Fernando Henrique ao poder, quando, de fato, o país embarcará no neoliberalismo. Tal doutrina postula um Estado diminuto e com baixa intervenção na economia que pode ser resumida em quatro tendências: a desnacionalização da economia, a desregulamentação dos mercados, a desestatização e a desproteção do cidadão.
Em nosso caso concreto, assistiu-se ao sucateamento do Estado, a drenagem da arrecadação para o pagamento de juros e amortização da dívida pública, um processo escandaloso de privatizações, a desregulamentação de vários setores essenciais, ajuste fiscal, taxas de juros elevadíssimas para atração do capital estrangeiro especulativo, desprezo pelo setor produtivo, reformas na seguridade social, ataque aos movimentos sociais e uma intensa mutilação da Constituição de 88. Cada um desses temas vale um texto próprio sobre, cabendo nos limites aqui propostos à pontuação dos temas e a definição do modelo de Estado aplicado como do tipo “predatório”, definição feita por Marcio Pochmann.
Os resultados da atuação desse Estado Predatório teriam sido piores se não fosse a resistência dos setores organizados da sociedade, em especial o movimento sindical. O fato é que ao se eleger em 2002, Lula terá pela frente um aparelho estatal quebrado e a chamada herança maldita de FHC. Dada essa situação, iniciou um governo mantendo a política econômica anterior, já no período eleitoral tinha sinalizado ao Capital com a “Carta ao Povo Brasileiro”. Tal fato gerou uma onda de críticas, frustrações e rachas na base do governo e no movimento social.
As críticas eram pertinentes. As taxas de juros se mantinham elevadas, um ajuste fiscal de grande porte foi realizado, a reforma da previdência do setor público e a receita da arrecadação continuou – e continua – a ser drenada para o pagamento de juros e amortizações da dívida. Duras críticas também foram feitas em relação à ausência de reformas estruturais. Nos últimos 13 anos foi opção do governo não fazer o enfrentamento dos setores conservadores para a realização das tão necessárias reformas, com destaque para a democratização dos meios de comunicação, que são o principal polo de oposição a qualquer projeto progressista para o Brasil. Contudo, timidamente – e mantendo-se contraditório –, o governo Lula tomou medidas, seguidas por Dilma, que se avolumaram com o passar do tempo e que permitem falar nos retornos de um papel mais ativo e estruturado do Estado e num incompleto Projeto Nacional de Desenvolvimento.
De modo didático, agruparam-se em quatro grandes blocos as medidas tomadas pelos governos progressistas, sem a intenção de restringir a isso todas as ações.
O primeiro diz respeito às políticas sociais que propiciaram a melhoria na distribuição de renda. O Programa Bolsa Família é o destaque por ter sido responsável por manter em torno de 36 milhões de pessoas distantes da linha de pobreza e por ter atendido até abril de 2016 97,3% das famílias pobres do país. Lugar comum na fala da face mais reacionária da oposição por ser supostamente clientelista, acumulou 3,1 milhões de famílias que se desvincularam espontaneamente do programa por não mais precisarem do benefício. Seu impacto no dinamismo da economia ainda está sendo medido e até no empoderamento da mulher, que era responsável exclusivamente por receber o benefício até recentemente.
Ao lado do PBF, por demanda das Centrais Sindicais, a política de valorização do salário mínimo foi essencial para a elevação da renda da classe trabalhadora que teve ganhos reais desde a implementação dessa política. A extensão do reajuste aos beneficiários da previdência social, ampliados pelas mudanças no Benefício da Prestação continuada e na Previdência Rural, impactou na renda dos aposentados que são responsáveis pela manutenção da renda de mais de 60% dos municípios brasileiros, segundo o Ministério da Previdência Social. Sem dúvida essas medidas foram as principais responsáveis pelo aumento na distribuição de renda.
Um segundo bloco de ações refere-se ao papel do Estado como indutor ao desenvolvimento. O Programa de Aceleração do Desenvolvimento (PAC) foi responsável por investir 1,9 trilhões de reais até 2015 em infraestrutura logística, energética, social e urbana. O PAC alterou significativamente a realidade brasileira e contribuiu para o dinamismo da economia. Desde programas extremamente simbólicos como o Luz para Todos, passando pelo Minha Casa, Minha vida que aqueceu o mercado imobiliário, até grandes e polêmicos empreendimentos que pretendem eliminar gargalos energéticos e logísticos.
Juntamente a esses investimentos diretos por parte do Estado tem-se medidas que contribuem para a expansão do consumo como a criação do crédito consignado, a atuação dos bancos públicos praticando taxas mais baixas e o crédito para a agricultura familiar, para ficarmos em alguns exemplos. Outras medidas estimulam as empresas nacionais, como o Simples Nacional que reduziu a carga tributária de pequenas empresas e contribuiu na formalização de postos de trabalho; e a política do conteúdo nacional que obrigou as estatais a optarem por produtos fabricados no país e alavancou diversos setores. O impacto das compras feitas pela Petrobras para a reativação do setor naval no Rio de Janeiro é visível.
A Política de Desenvolvimento Produtivo que visa promover a competitividade de longo prazo da economia brasileira e as desonerações de impostos para setores considerados essenciais fecham o arco das atividades mais relevantes do Estado nessa retomada de um papel ativo – direto e indireto – para proporcionar o desenvolvimento nacional. Essas medidas proporcionaram o crescimento da economia brasileira no período e foram essenciais para a geração de mais de 10 milhões de empregos, reduzindo o desemprego a taxas de pleno emprego.
Em terceiro lugar tem-se a recomposição do próprio Estado. A primeira coisa a ser notada é a realização de concursos públicos para repor o número insuficiente de funcionários públicos. Bem como a reestruturação de carreiras e a valorização do funcionalismo. Esses processos não foram perfeitos, pois permanecem inúmeras críticas por parte das entidades sindicais em relação ao Estado-patrão, como a permanência de um numero excessivo de terceirizados, inclusive em atividade fim.
Mas o fato é que houve uma expansão e fortalecimento da estrutura estatal. No campo da educação, para nos restringirmos a um exemplo, foram criadas 14 novas universidades federais, 126 extensões de universidades já existentes e 214 escolas técnicas. O jargão “nunca antes na história desse país”, de Lula, se aplica bem ao caso. No governo Dilma avançou-se quanto ao financiamento da educação com a aprovação da meta de 10% do PIB ao setor, incluso os 50% da renda gerada pelo Pré-sal. É uma recomposição de vulto do Estado em um setor tão estratégico. A educação também foi beneficiada com programas destinados ao setor privado, como o Prouni e o Fies, que proporcionaram o ingresso de jovens de baixa renda na educação superior.
Em relação às estatais, preservou-se as que sobraram do tempo de FHC e algumas novas foram criadas, com destaque para a Empresa Brasileira de Comunicações (EBC). Petrobras, Correios, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES chegaram a ser símbolos na campanha eleitoral de 2006. A Petrobras teve uma grande expansão e investimento, não à toa que virou o alvo da oposição e dos interesses internacionais da área do petróleo. As concessões feitas em alguns setores, e criticadas pela esquerda, como a privatização de aeroportos, não se deram nos mesmos moldes contratuais que em tempos neoliberais.
Por fim, os últimos 13 anos foram de democratização do Estado. A própria montagem da estrutura de governo foi reflexo desse movimento de abertura para os mais diversos segmentos da sociedade. A criação de secretarias e ministérios para atuação em relação a pautas específicas, como a Secretaria Especial de Mulheres, a Secretaria da Promoção da Igualdade Racial, o Ministério de Desenvolvimento Agrário, dentre outros, proporcionou que o Estado tivesse melhores condições no atendimento das demandas e uma melhor qualidade na elaboração das políticas públicas. Outro fator relevante foi a realização das conferências, 74 delas só nos dois mandatos de Lula. As conferências foram espaços importantes para a crítica e autocrítica do governo e resultaram em inúmeras políticas públicas.
O que os governos progressistas lograram em pouco mais de uma década foi demonstrar que era possível crescer a economia e distribuir renda ao mesmo tempo. E mais, aumentar os salários da classe trabalhadora e manter a inflação sob controle. Ocorre que os governos progressistas foram insuficientes em outros aspectos e, como já apontamos, chamamos de incompleto o Projeto Nacional de Desenvolvimento que estava em curso. Faltou convicção das forças hegemônicas para enfrentar a tarefa de realizar as reformas estruturais que o país tanto necessita – a questão da terra, por exemplo – e planejar de fato um projeto que possibilite ao Brasil dar um salto ao futuro resolvendo todas as mazelas sociais e gargalos estruturais que o amarram ao subdesenvolvimento.
Agora, saltar para o passado neoliberal e conservador não estava nos planos dos críticos da insuficiência. Temer e demais golpistas são o passado que não nos interessa. Não tratarei de todos os aspectos do governo golpista, já que outros artigos da série tratam de modo detalhado do perigo para os direitos trabalhistas, previdência, a mudança na política externa e significado do golpe em si. Vou me ater aos aspectos mais gerais do Estado.
Na preparação do golpe, o PMDB, capitaneado por Temer, lança o documento UMA PONTE PARA O FUTURO. Nele se lê que “nos últimos anos é possível dizer que o Governo Federal cometeu excessos, seja criando novos programas, seja ampliando os antigos, ou mesmo admitindo novos servidores ou assumindo investimentos acima da capacidade fiscal do Estado.” O intuito foi dar um recado ao chamado mercado de que o fiscalismo estaria de volta – preocupado somente com o pagamento de juros – e o Estado seria reduzido para dar espaço à iniciativa privada.
Nas propostas, isso fica claro: “executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime anterior de concessões na área de petróleo, dando-se a Petrobras o direito de preferência.” E mais, “promover legislação para garantir o melhor nível possível de governança corporativa às empresas estatais e às agências reguladoras, com regras estritas para o recrutamento de seus dirigentes e para a sua responsabilização perante a sociedade e as instituições.”
Outro golpista, o PSDB neoliberal de velha plumada, edita documento em apoio a um possível governo de Temer com o nome de PRINCÍPIOS E VALORES PARA UM NOVO BRASIL. O apoio do PDSB é no sentido de ser “imperativo que o novo governo proponha, em regime de urgência, uma agenda de reformas estruturais que criem condições para que o Brasil volte a ser um país competitivo, com melhores condições de gerar emprego, renda e bem-estar para as pessoas, e com equilíbrio nas contas públicas. E, ainda, recupere as agências regulatórias por meio de gestão profissional que busque de forma equilibrada o interesse da sociedade e o aumento significativo do investimento em infraestrutura, baseado num programa consistente de privatizações, concessões e PPPs.”
Antes do golpe esses documentos já deixavam claro o que viria a ser o governo golpista. Não precisa ser nenhum especialista em análise de discurso para entender que essas propostas estão longe de ser um salto para o futuro ou que irão construir um novo Brasil. Trata-se, sim, de um salto para o passado, para o velho Brasil.
Feito o golpe, o governo interino na montagem do ministério já demonstra a que veio ao não nomear uma única mulher e reduzir o número de pastas, eliminando algumas e fazendo a fusão de outras sem critério técnico. Tem-se o fim das secretarias específicas, mulheres e igualdade racial; de ministérios estratégicos, como o da ciência e tecnologia; e o simbolismo de acabar com a pasta da cultura, que teve que retroceder da decisão. Essas medidas configuram, hegemonicamente, uma Esplanada dos Ministérios sem capacidade técnica, conservadora, elitista e voltada para o regresso.
As falas iniciais de alguns titulares foram constrangedoras. O ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP – PR) informou que o país não tem condições de sustentar mais o SUS. O ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM – PE) defendeu a cobrança de mensalidades para os cursos de extensão e pós-graduação profissional nas universidades públicas. Ambos tiveram que voltar atrás, mas a intenção está posta. Na prática tem-se a redução do Programa Mais Médicos, pelo primeiro, e a suspensão de novas vagas do Prouni, Fies e Pronatec, pelo último.
Quanto aos programas sociais, no Minha Casa, Minha vida foi anunciado o corte dos subsídios para os mais pobres e redução pela metade do montante destinado à construção de novas unidades. Após o protesto do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, que invadiu o escritório da Presidência da República em São Paulo, o governo recuou da medida. Em relação ao Bolsa Família, a meta no documento PONTE PARA O FUTURO é de uma redução drástica do número de famílias atendidas, mas dada a simbologia do programa essa redução ainda não ocorreu e o benefício foi reajustado recentemente. Um truque de publicidade: mantêm-se o programa social mais famoso como vitrine e desmonta-se o resto, se não houver resistência do movimento social.
Na área econômica, Meirelles tem plenos poderes para comandar o ajuste fiscal. Com a única preocupação de limitar o gasto público, leia-se o gasto com a área social e os investimentos, e manter o pagamento da dívida, o pacote do Ministro da Fazenda inclui o envio de uma emenda constitucional para limitar o gasto do governo, o uso de 2 bilhões de reais do fundo soberano do Pré-sal para cobrir o déficit público – há discordância sobre o cálculo do déficit –, a devolução de 100 bilhões do BNDES para o Tesouro Nacional com o mesmo objetivo – e o esvaziamento do banco como consequência –, além de uma nova reforma da previdência. Típica política dos anos 90.
É intenção também da área econômica alterar a governança das estatais e fundos de pensão através de um projeto de lei que tramita no Congresso. Se olharmos a nomeação dos novos dirigentes, o perfil dos indicados diz muito sobre os interesses envolvidos. Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, BNDES e Petrobras são presididas, agora, por pessoas que têm uma larga folha de serviços prestados ao mercado e ao PSDB. No caso da Petrobras, o escolhido é Pedro Parente, que até ser nomeado era o presidente do Conselho de Administração da BM&F Bovespa e foi ministro do apagão de FHC, além de prestar consultoria ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Sabemos de todos os interesses que estão por trás do Pré-sal.
Quanto às concessões e privatizações prometidas no documento do PMDB, a primeira medida prática foi a edição da medida provisória 727 que cria o “Programa de Parcerias de Investimentos” (PPI), que visa “a ampliação e fortalecimento da interação entre o Estado e a iniciativa privada por meio da celebração de contratos de parceria para a execução de empreendimentos públicos de infraestrutura e de outras medidas de desestatização.” Segundo o jornal Folha de São Paulo, o governo espera arrecadar em 2017 entre 20 e 30 bilhões com as privatizações e ainda diz que“o presidente interino orientou seus ministros a levantarem em suas áreas ‘tudo o que puder ser privatizado e concedido ao setor privado’”.
O governo ilegítimo de Temer tem um pouco mais de 70 dias. Nesse pouco tempo tem acumulado um conjunto enorme de polêmicas, gafes, constrangimentos e ilegalidades. Ministros investigados – três já se foram –, logotipo do governo de caráter conservador e com bandeira desatualizada, influência de Eduardo Cunha, erro do currículo de Marcela Temer, afastamento ilegal do presidente da EBC e, por fim, Alexandre Frota entregando propostas ao ministro da educação. Esses são alguns exemplos. O governo de Temer aparenta inabilidade e fragilidade para levar à frente o “pacote de maldades”. Se confirmado pelo Senado pode ganhar força e, pela política que descrevemos até aqui, aplicar o retorno ao neoliberalismo.
Temer é tudo de mais atrasado na política brasileira. A composição do governo é típica da República Velha: todos homens, brancos e ricos; a política é a neoliberal de Fernando Henrique Cardoso e Collor, do último ele se inspirou para também acabar com o Ministério da Cultura; há um ranço de autoritarismo como nos tempos da Ditadura e desde Médici não se tinha um ministério só de homens; e é o golpismo da UDN. O objetivo do golpe e desse governo é garantir aos que não tem voto a interrupção do projeto progressista que estava em curso e a volta das políticas neoliberais de Estado mínimo e ausência de defesa dos interesses nacionais. Ser contra o golpe é defender a democracia e o futuro do Brasil.
*Renato Soares Bastos é professor e pesquisador do CES. É mestre em história econômica e graduado em história pela FFLCH-USP; atualmente é graduando em direito pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – USP.
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