19 de fev. de 2017

‘Negra não é objeto sexual e todo ser humano merece respeito’

Por João Negrão no Manga com Leite

Mulheres do mundo inteiro estão se mobilizando para uma greve mundial no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, contra a desigualdade e a violência doméstica. A ideia é uma paralisação geral em todos os países.

Para repercutir o tema entre as minhas amigas e colegas, lancei nos vários grupos de WhatsApp dos quais participo o pedido de opinião das mulheres (e homens também) sobre o evento.

A primeira a responder foi a professora Silvina Jana Gomes, formada em Letras, com habilitação em Francês, pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Silvina, de 30 anos, é natural de Guiné-Bissau, país de língua portuguesa da África Ocidental. Ela veio para o Brasil faz oito anos, para estudar por meio de programa do governo brasileiro com países africanos.

Pertencente às etnias papel e balanta, dois dos 19 grupos que atualmente (já foram 32) formam a população de pouco mais de 1,5 milhão de habitantes de Guiné-Bissau, Silvina continuou no Brasil depois de formada inicialmente para ministrar aulas para refugiados, especialmente haitianos.

Desde estudante se engajou em movimentos contra o racismo e de mulheres, defendendo as culturas africana e afro-brasileira. Ela é membro do IMUNE (Instituto de Mulheres Negras), uma das mais atuantes entidades do movimento negro em Mato Grosso.

Eis o meu bate-papo com ela:

Silvina, como você vê este movimento internacional das mulheres?

Muito importante. As mulheres vão mostrar a sua capacidade de mobilização internacional e marcar posição contra o machismo, que é mundial.

Pra você, o que representa o 8 de março?

Nossas antecessoras viram que era necessário as mulheres fazerem a reivindicação contra a exploração, porque elas trabalhavam 15 horas por dia e recebendo um salário miserável. Vinte e cinco delas foram carbonizadas lutando pelos seus direitos como mulher e também como seres humanos. A morte delas não foi em vão. Plantou esta semente de nossa luta.

É uma luta ainda atual?

É. Acredito que todos os dias são dias de mulheres, mas essa data representa dia de luta pelos direitos igualitários. Nossa luta continua, porque está tendo muito retrocesso nos dias atuais.

Você é de Guiné-Bissau. Como é o 8 de março lá?

Em Guiné Bissau, quando eu era criança não entendia o porquê deste dia 8 de março. Os homens colocavam as roupas “espera” e iam nos mercados fazer as compras e era o dia para eles fazerem as comidas em casa. Eles ocupavam as tarefas que eram das mulheres. Só depois de adulta que fui pesquisar e entender o quê desta data.

E qual a sua compreensão hoje?

Hoje eu vejo que todo ser humano merece respeito, porque além da mulher, muita gente sofre desrespeitos, independente de ser mulher ou homem. Mas a mulher é um alicerce não apenas da família, mas da sociedade. Por isto, o desrespeito com a mulher é o desrespeito com todos da sociedade. Por isso eu acho que não devemos lembrar somente no dia 8 de março, mas todos os dias, que sejamos reconhecidas e amadas.

Apesar de muitas lutas e conquistas, a desigualdade continua. Como você sente isto?

Eu sinto que os homens machistas que vêm a mulher como objeto sexual. E em relação à mulher negra eu vejo que somos mais oprimidas e sofremos mais em relação às outras em termos de direitos e de machismo. Um exemplo: quando ando na rua passa homem e diz “que negona gostosa”. Isso já mostra bem claro que o desejo daquele homem é sexual. Isso me incomoda porque eu sou mulher guerreira, batalhadora e sonhadora e penso igual uma mulher de qualquer outra raça. Sinto que a mulher negra é visto mais como símbolo sexual. Eu sirvo só para sexo?

Como vai ser o 8 de março aí em Cuiabá?

As mulheres estão se mobilizando, debatendo e o IMUNE com certeza vai marcar posição nesta data.

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