O general Braga Netto, interventor do Rio de Janeiro. foto SERGIO LIMAAFP |
A medida já foi adotada em ao menos outras três ocasiões e acabou proibida pela Justiça fluminense
por AFONSO BENITES no El País
A intervenção do governo Michel Temer (PMDB) na segurança pública do Rio de Janeiro mal começou e já enfrenta seus primeiros entraves. Nesta segunda-feira, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, anunciou que a gestão federal prepara uma série de mandados coletivos de busca e apreensão para bairros inteiros do Rio. Medida essa que já foi adotada em ao menos outras três ocasiões e acabou proibida pela Justiça fluminense.
Cumprir mandados coletivos é algo incomum. Significa, por exemplo, que policiais (ou militares que estejam sob o comando do interventor) teriam a autorização para vasculhar qualquer casa da favela da Rocinha, uma comunidade com quase 70.000 habitantes. As varreduras ocorreriam mesmo se não houvesse a suspeita do cometimento de crimes pelos moradores ou frequentadores dessas residências. Para a ex-presidenta Dilma Rousseff, "a iniciativa do governo golpista de promover mandados coletivos de busca, apreensão e captura é uma das mais graves violações aos direitos civis que o Brasil enfrenta desde o fim da ditadura". Dilma comentou a questão no Twitter.
No ano passado, quando a polícia foi autorizada a investigar todas as casas da comunidade do Jacarezinho, o Judiciário suspendeu a decisão alegando que o abandono das regras e princípios jurídicos não é permitido nem em tempos de paz contra os cidadãos, nem em tempo de guerra contra os inimigos. Na ocasião, o mandado tinha como objetivo investigar a morte de um policial civil e a consequente reação que resultou no assassinato de sete moradores do local.
A possível batalha jurídica que Temer enfrentará já está no radar de vários especialistas do assunto. O procurador da República Vladimir Aras, por exemplo, afirma que esse mandado coletivo seria ilegal. “A intervenção federal não suspende garantias individuais. Entre essas garantias está o direito à inviolabilidade domiciliar. Se houvesse sido declarado o estado de sítio, seria possível fazer buscas coletivas, inclusive sem mandado judicial”, alertou em uma rede social. "Os mandados coletivos são um chute na porta do cidadão, de qualquer cidadão", reclamou o deputado Wadih Dahmous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio.
Opositores do Governo reclamam que a proposta não foi devidamente embasada. “Essa decisão da intervenção não teve qualquer planejamento. Foi uma decisão atabalhoada. Foi um tiro no escuro. Não foi feito nenhum balanço das ações anteriores”, reclamou o líder da minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE). Nos últimos dois anos o Rio de Janeiro foi palco de 18 operações de Garantia da Lei e da Ordem, conhecidas como GLO. Nelas, militares das Forças Armadas e da Força Nacional eram deslocados para fazer o policiamento de diversas regiões do Estado. Os resultados delas ainda são desconhecidos do público em geral.
Endurecimento de lei penal
Enquanto o Governo se prepara para responder a uma enxurrada de processos contrários à sua intervenção no Rio, no Legislativo os congressistas tentarão aprovar medidas que endureçam as leis penais. Representantes da bancada da segurança pública, conhecida como bancada da bala, já esperam que projetos como o que a prevê a redução da maioridade penal, o que diminui os direitos dos detentos e o que altera o estatuto do desarmamento voltem à pauta do Parlamento.
“Se não endurecer a legislação, o marginal vai ver que o crime compensa. A intervenção no Rio é necessária, mas ainda assim, iremos enxugar o chão com a torneira aberta. As causas dessa criminalidade são as leis brandas e a sensação de impunidade”, afirmou o deputado Capitão Augusto Rosa (PR-SP), presidente da Comissão de Segurança.
Na mesma linha seguiu o deputado Major Olímpio Gomes (SD-SP). “Voto a favor desse decreto de intervenção, mas se você não criar um temor do criminoso de ser apenado, não vai mexer com nada”.
Ao menos três fatores devem influenciar para que pauta de segurança seja fortalecida no Congresso: ausência de projetos estruturantes na área econômica (a reforma da Previdência não pode ser votada enquanto a intervenção estiver em vigência), ano eleitoral em que políticos querem capitalizar feitos de olhos nos votos e o clamor popular estimulado pelo anúncio da gestão Temer de que vai pôr um fim na crise de segurança do Rio.
“Essa intervenção é mais um produto de comunicação e marketing do que um projeto sério. Se fosse uma intervenção de fato, teriam estratégia, planejamento. Tudo o que não tem”, criticou o deputado governista Índio da Costa (PSD-RJ). “O Governo encontrou uma saída honrosa para abandonar a reforma da Previdência. Agora, resta saber se ele vai conseguir dar um fim na crise do Rio, o que acho difícil”, ponderou o deputado oposicionista Júlio Delgado (PSB-MG).
Em outra frente, a relatora do decreto na Câmara, Laura Caneiro (MDB-RJ), já tenta estender o prazo em que a União continuará subsidiando as ações de segurança em seu Estado. No relatório que embasou a votação na Câmara, Carneiro sugeriu que no orçamento da União de 2019 constem novos recursos para a área de segurança do Rio e pediu que o Ministério do Desenvolvimento Social desenvolva projetos em todas as cidades do Estado.
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