18 de fev. de 2014

A corrupção na União Europeia

Nem mesmo os países mais ricos da Europa escapam da corrupção, mostra relatório da União Europeia. Mas o desafio europeu para superar o problema é bem menos complexo do que o latino-americano, avalia cientista política
No mês de fevereiro, a Comissão Europeia divulgou o primeiro relatório sobre a corrupção nos Estados Membros.
O informe apresentado trouxe à tona o espectro da corrupção que inúmeros cidadãos europeus ignoravam ou supunham que, por estarem vivendo em países ricos, não conviveriam com o problema. O dado mais alarmante é que a corrupção afeta a todos os países da União Europeia (UE) com um custo estimado em 120 bilhões de euros ao ano.

O informe pode ser dividido em duas partes: uma primeira refere-se à percepção da população em relação a corrupção nos seus respectivos países; e  a segunda diz respeito a Business e corrupção, ou seja, relação setor privado e administração pública.

Na primeira parte, a mesma pergunta foi aplicada em 27 países, totalizando 26.786 entrevistados. Selecionamos apenas sete países com situação econômica e institucional distintas, mas que traduzem o panorama geral na União Europeia.

Inicialmente se pediu para o entrevistado avaliar “Em que medida o problema da corrupção é comum em nosso país?” e sintetizamos o estado geral da corrupção em alguns desses países:

PaísMuito comumAlgo  
comum
Muito  
raro
Total entrevistados
Portugal55%35%1%1026
Espanha65%30%1%1006
Itália58%39%0%1020
França49%19%3%1058
Alemanha43%26%7%1545
Reino Unido38%26%7%1308
Áustria53%24%4%1052
http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb_special_399_380_en.htm

Uma outra questão apresentada aos entrevistados  foi : “Nos últimos três anos, diria que o nível de corrupção em nosso país…?”  e destacamos os extremos dentre os quatro intervalos apresentados:
PaísAumentouDiminuiu
Portugal72%3%
Espanha77%1%
Itália74%2%
França51%3%
Alemanha45%5%
Reino Unido59%2%
Áustria44%11%
Fonte: http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb_special_399_380_en.htm

Sobre as Instituições, a pergunta realizada foi “Existe corrupção nas Instituições Públicas Nacionais?” e o entrevistado deveria dizer se concordava ou não com a assertiva:
PaísConcorda TotalmenteTende a ConcordarTende a Discordar
Portugal37%49%4%
Espanha68%27%2%
Itália56%37%3%
França26%50%12%
Alemanha22%52%15%
Reino Unido21%51%13%
Áustria27%46%16%
Fonte: http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb_special_399_380_en.htm

E decorrente da pergunta anterior, o entrevistado deveria apontar onde o abuso de poder e o suborno eram mais recorrentes nas instituições, destacamos as três instituições dentre as 15 estipuladas  na pesquisa:
PaísPartidos políticosPolíticos em nível nacional, regional ou localBancos ou instituições financeiras
Portugal59%59%47%
Espanha84%72%62%
Itália68%63%40%
França70%58%34%
Alemanha51%49%38%
Reino Unido56%55%47%
Áustria60%59%29%
Fonte: http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb_special_399_380_en.htm

A amplitude de informações na primeira parte permitiria redigir uma tese de doutorado, mas esta pequena amostra dá-nos uma idéia de como os cidadãos têm percebido a corrupção e podemos dizer que não é muito positiva. Em geral, a percepção de aumento da corrupção recai sobre a maioria dos países, 76% em toda UE, sendo exceção aqueles que tradicionalmente apresentam bons indicadores como: Dinamarca, Suécia, Finlândia. Esses países sempre aparecem no Corruption Perceptions Index- CPI como os menos corruptos, portanto não há novidade. A novidade reside sobre a França, a Alemanha, o Reino Unido e o Áustria, por exemplo, apresentarem índices negativos em relação à percepção da corrupção.

Outro aspecto diz respeito aos altos índices de desconfiança nas instituições como partidos, políticos e instituições financeiras, por do abuso de poder e suborno. Nos sete países que elencamos na amostra é possível  afirmar  que, nesse item, a corrupção tem similaridade com o que encontramos nas pesquisas do Latinobarômetro que destaca, há vários anos,  as mesmas instituições como as menos confiáveis.

A segunda parte do relatório refere-se aos negócios e às barreiras que as empresas encontram nos países dos entrevistados. Dentre as nove variáveis apresentadas, a corrupção é apontada como um problema muito grave para a empresa “quando faz negócios”. A seguir destacamos o percentual e a posição que ocupa:
PaísCorrupção
Portugal3º lugar-  39%
Espanha4º lugar- 38%
Itália7 º lugar – 33%
França6º  lugar – 36%
Alemanha6º  lugar – 10%
Reino Unido5º  lugar –7%
Áustria4º lugar –16%
Fonte: http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb_special_399_380_en.htm

Obviamente que os países que sofrem com a crise econômica como Espanha, Itália e Portugal, tornam-se mais sensíveis à temática do mau uso do dinheiro público e aos privilégios que os políticos e partidos estão usufruindo. A novidade são países que não estão no mesmo quadro de crise se manifestarem intolerantes a esse tipo de prática.

O que fazer para coibir a corrupção e os recursos que se perdem em meio um complexo sistema de administração pública fragmentada em por distintas dimensões: nacional, regional, local e da UE?  A orientação vem em torno do fortalecimento de quatro eixos: mecanismos de controle; investigação e punição; dimensão política; e áreas de risco.

Para os mecanismos de controle, sugere-se o uso de políticas preventivas, fortalecimento dos mecanismos de controle externo e interno e sanções aos conflitos de interesse. No  eixo investigação e punição, propõe-se a criação de leis que criminalizem as práticas ilícitas e maior rigor nas punições. Na dimensão política, recomenda-se sanções ao financiamento ilegal de partidos políticos e definição de políticas de accountability. Por último, para as áreas de risco, aconselha-se a um melhor controle de contratos públicos com alta vulnerabilidade principalmente no setor de construção e de saúde.

Se as recomendações e os dados acima nos são familiares, o resultado positivo que a UE obterá nos próximos anos deve-se a quatro fatores: inicialmente a crise econômica que coloca uma pressão adicional ao problema da corrupção; segundo, a UE tem como impor sanções aos Estados Membros para que promovam uma política de transparência e boa governança permitindo controlar a corrupção; terceiro, os cidadãos de países onde a corrupção é mais evidente, como Espanha e Itália, esperam uma resposta imediata por parte da UE; e finalmente, a presença do Greco (Group of States Against Corruption), que monitora, avalia e acompanha todos os Estados Membros para saber quais são os instrumentos legais existentes e os que precisam ser incorporados aos países da UE para ampliar o controle da corrupção.

Em suma, a necessidade e a vontade de mudar acrescida de maturidade política da UE permitirá que rapidamente se controle a corrupção. É uma formula razoavelmente simples que, desafortunadamente, o Brasil e os países da América Latina não aprenderam equacionar.

POR CONGRESSO EM FOCO
Rita Biason É cientista política e coordenadora do Centro de Estudos e Pesquisas sobre Corrupção na UNESP, Câmpus de Franca (SP). E-mail: cepcorrupcao@franca.unesp.br.

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