Nomeado por Dilma Rousseff (PT), Rodrigo Janot comandou o Ministério Público nos últimos quatro anos Foto Antonio Cruz/ Agência Brasil |
Quem irá suceder Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da República?
Entre os candidatos, há pouco questionamento aos métodos usados pela Lava Jato; prioridade é blindar a operação
por Daniel Giovanaz no Brasil de Fato
Na última semana de junho, cerca de 1,2 mil membros do Ministério Público Federal (MPF) serão chamados a votar no novo procurador-geral da República e chefe do Ministério Público da União. São oito candidatos inscritos, mais que o dobro do último pleito interno – um recorde na história do MPF. Os três mais votados formarão a chamada “Lista Tríplice”, que será enviada ao presidente da República para orientar a escolha do próximo comandante da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Conforme tradição inaugurada pelo governo Lula (PT) e mantida por Dilma Rousseff (PT), para garantir a autonomia da PGR, o presidente indica o nome mais votado entre os colegas do Ministério Público.
Segundo informações publicadas pelo jornal Folha de S. Paulo em abril, Michel Temer (PMDB) estuda romper com essa tradição para se proteger de denúncias de corrupção. Mais ou menos como acontecia há 20 anos.
Autonomia em jogo
Antes dos governos PT “despolitizarem” a escolha do comandante da PGR, os presidentes da República baseavam a escolha em critérios não-técnicos, como a amizade e a confiança. O caso mais emblemático foi o de Geraldo Brindeiro: nomeado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 1995, ele recebeu o apelido de “engavetador-geral da República” por não levar adiante investigações que pudessem atingir o então presidente tucano.
Dos 626 inquéritos criminais que chegaram até Brindeiro, apenas 60 denúncias foram aceitas – menos de 10%. Uma das denúncias engavetadas por ele, por exemplo, dizia respeito à compra de votos para aprovação da emenda que permitiu a reeleição de FHC. Geraldo Brindeiro tem 68 anos e é primo de Marco Maciel, vice-presidente no governo Fernando Henrique Cardoso.
Nomeado pela ex-presidenta Dilma, Rodrigo Janot ocupou o cargo entre 2013 e 2015 e foi indicado para mais dois anos de mandato. A fama que o persegue é oposta à de Brindeiro: em um mesmo dia, 14 de março de 2017, Janot encaminhou 83 inquéritos ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra parlamentares e ministros do governo Temer. Ele também é conhecido por responder com veemência qualquer crítica aos abusos cometidos no âmbito da operação Lava Jato.
Além de comandar a PGR, o sucessor de Rodrigo Janot será presidente do Conselho Nacional do Ministério Público até 2019. O mandato pode ser estendido até 2021, caso o futuro presidente da República concorde com a renovação.
Pista livre
No último dia 29 de maio, sete dos oito candidatos à PGR se reuniram em São Paulo para o primeiro debate da campanha, organizado pela Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). Perguntados sobre a operação Lava Jato, todos assumiram uma postura elogiosa e expressaram preocupação com qualquer tentativa de regular ou limitar as investigações.
A curitibana Ela Wiecko Volkmer de Castilho foi a única que não compareceu ao debate, e é uma das poucas vozes destoantes. Embora evite críticas explícitas à Lava Jato, ela costuma ressaltar a necessidade de se respeitar a Constituição Federal na condução das investigações.
Conheça o perfil dos oito subprocuradores-gerais que concorrem à vaga de Janot:
Nomeação pode mudar rumos da Lava Jato
A função do procurador-geral da República, segundo a Constituição Federal de 1988, é promover ações para denunciar ilegalidades cometidas por deputados federais, senadores, ministros, presidente e vice-presidente da República. Ele também pode propor ao STF intervenção em processos que tramitam em âmbito estadual, além de sugerir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) a federalização de crimes contra os direitos humanos.
O sucessor de Janot deverá ser consultado em todas as ações de inconstitucionalidade e em todos os processos que correm no âmbito do STF. Ou seja, ele entra em cena na maior parte dos processos da Lava Jato, quando a defesa dos condenados nas duas primeiras instâncias entra com recurso ou quando os réus têm foro privilegiado.
Uma das medidas mais polêmicas tomadas durante o mandato de Rodrigo Janot foi o perdão judicial concedido a Joesley Batista, um dos donos da JBS, investigado na Lava Jato. O futuro procurador-geral da República poderá, por exemplo, questionar os termos do acordo de delação premiada e apresentar nova ação contra o empresário, sugerindo ao STF a retirada dos benefícios concedidos por Janot.
Entre os oito postulantes ao cargo máximo da PGR, Sandra Cureau foi quem defendeu com mais entusiasmo a Lava Jato no primeiro debate, sem apontar nenhuma ressalva à atuação da força-tarefa: "Nunca deixei, nem vou me deixar intimidar, e me comprometo com vocês a continuar e a aprimorar a Operação Lava Jato e todas as que se sucederem". Eitel Pereira foi candidato a deputado federal pelo Partido da Frente Liberal (PFL) em 1994 e, no debate do dia 29, disse de maneira genérica que pretende combater a corrupção “dentro do meu estilo, firme, sereno e preocupado”.
Ela Volkmer de Castilho foi exonerada do cargo de subprocuradora da PGR no ano passado por ter participado de protestos contra Michel Temer (PMDB). Em outras oportunidades, chamou o impeachment de “golpe” e disse que o MP “é muito mais que a Lava Jato”. Ela não participou do primeiro debate no dia 29 de maio, mas disse que “o compromisso (…) não pode ser outro senão cumprir a Constituição e proceder de acordo com o devido processo legal”.
Em entrevista ao portal UOL, em agosto de 2015, Carlos Frederico Santos criticou o uso de “efeitos midiáticos” pelo MP na condução da Lava Jato. Em todos os debates e pronunciamentos recentes, porém, elogiou a operação e não fez ressalvas ao trabalho da força-tarefa.
Raquel Dodge foi criticada por Rodrigo Janot em abril deste ano por tentar "afetar a Lava Jato" ao propor a limitação do número de procuradores por área no Ministério Público. No debate do dia 29, ela se posicionou a favor da ampliação e da intensificação da Lava Jato.
No primeiro debate entre os candidatos, Franklin Rodrigues da Costa também foi taxativo ao mencionar a operação: “Da Lava Jato, a gente nem fala, porque já se sabe que vai prosseguir. Os colegas que estão auxiliando [Rodrigo Janot] vão permanecer, porque já conhecem esse tema. (…) Eu me comprometo a continuar e a aprimorar a Operação Lava Jato e todas as que se sucederem”.
Mario Bonsaglia defende a proposta de limitar em 10% o número de procuradores cedidos em cada área de atuação, mas considera que a norma não deve ser aplicada à Lava Jato. Segundo Bonsaglia, cada vez mais procuradores devem se juntar às investigações da Lava Jato, dada a importância excepcional da operação.
Nicolao Dino é irmão do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), suspeito de receber dinheiro da Odebrecht via caixa 2, segundo informações fornecidas no acordo de delação da empreiteira. Entusiasta da Lava Jato, pondera que é necessário“rever, refletir e eventualmente corrigir os rumos”.
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