por Ricardo Cappelli
O que verdadeiramente motivou o acordo PT-PSB que levou os socialistas à neutralidade? Acertos políticos são como ilhas no oceano. O que aparece na superfície é uma ínfima parte do que fica escondido debaixo d'água.
O pragmatismo é plenamente justificável, e até recomendável, quando utilizado para o alcance de objetivos estratégicos superiores. Se o acordo anunciado tivesse como resultado o apoio do PSB ao PT na disputa pela presidência seria facilmente compreendido.
Os partidos envolvidos estariam fazendo sacrifícios para forjar a tão sonhada unidade da esquerda. Foi isso o que ocorreu?
A petista Marília Arraes viu sua candidatura ao governo de Pernambuco ser retirada e o PT nacionalmente continuar isolado. Sua cabeça foi servida em nome da unidade? Não.
O socialista Márcio Lacerda, pré-candidato ao governo de Minas Gerais, foi pego de surpresa ao ver sua cabeça fazendo companhia a de Marília na bandeja. Reagiu com indignação, revolta e “desprezo”.
Se as decapitações não aconteceram em nome da unidade da esquerda, o que justificou tamanha agressividade?
No dia anterior, consultado sobre a hipótese de neutralidade, Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, declarou: “não existe esta hipótese, o PSB não nasceu para ser satélite de ninguém”. No dia seguinte, tudo mudou.
Sabendo que o PSB caminhava para Ciro, o PT aumentou a pressão. Marília Arraes representava uma ameaça à reeleição do governador pernambucano Paulo Câmara. De onde é o presidente nacional do PSB? Pernambuco, claro. Uma eventual derrota do PSB no estado poderia colocar em risco o controle do diretório local sobre a legenda nacionalmente.
O PT, tendo consciência que o PSB não o apoiaria, levou às últimas consequências sua estratégia de manter a hegemonia na esquerda a qualquer custo. Fechou o acordo apenas pela neutralidade, com o único objetivo de isolar Ciro Gomes, alçado ao posto de “grande inimigo”.
Como se pode constatar, tudo costurado em nome dos mais elevados interesses nacionais.
Os desdobramentos são imprevisíveis. Alckmin, de longe, festeja. Viu um partido de esquerda ser anulado e parte dele ser autorizado formalmente a declarar apoio a sua candidatura. E o melhor, não precisou fazer nenhum esforço para isso.
Paulo Câmara também ganhou ao ser consagrado o único candidato de Lula em seu estado. Como se comportará Marília? A petista se construiu na oposição ao Palácio do Campo das Princesas. Seu eleitorado acompanhará o cavalo de pau?
O caso de Minas é mais complexo. Lacerda é um político tarimbado, não tem seu futuro atrelado ao PSB. Foi o candidato de consenso entre PT e PSDB à prefeitura de BH.
Com as digitais de Pimentel, governador petista de Minas, nas lâminas que cortaram seu pescoço, como reagirá o ex-prefeito de BH? Ficará apenas na indignação do primeiro momento? O tucano Anastasia lidera a corrida ao Palácio da Liberdade.
Na política nem sempre dois mais dois é igual a quatro. Pode dar dois mesmo, ou até menos.
Lula e o PT também alcançaram uma vitória dentro do objetivo que traçaram para esta eleição: manter a hegemonia na esquerda. O PDT ousou questionar? Isolado. O PSB ousou questionar? Anulado. É preciso reconhecer a eficiência petista.
Ciro, “o cabra marcado pra morrer”, sai derrotado na tentativa de construir alianças. Lula, Temer e Alckmin, de forma tácita, atuaram juntos para isolá-lo. O establishment político luta pela manutenção do “mais do mesmo”, uma disputa entre PT e PSDB. Se o povo está participando destes acordos e vai endossá-los é outro papo.
Nem o mais pessimista poderia imaginar este cenário. A esquerda brasileira colocando interesses regionais, a manutenção de poder em estruturas partidárias e a busca desesperada pela manutenção da hegemonia da derrota acima do Brasil.
Só os militantes apaixonados e desavisados ainda sonham com 2018. Nos partidos a derrota na eleição nacional é dada como certa e o salve-se quem puder está a todo vapor.
Convenhamos, 2022 é logo “ali”.
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