Estudantes da UNE, UBES e UJS em manifestação no Anexo II da Câmara, na noite em que a redução da maioridade penal foi aprovada |
O golpe que Eduardo Cunha deu não foi só para reduzir a maioridade penal
De Brasília
Joaquim Dantas
Para o Blog do Arretadinho
Não tenho dúvidas quanto as intenções da direita brasileira no campo político, o golpe dado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, PMDB/RJ, na noite desta quarta-feira (1), não foi por um mero capricho pessoal para que a proposta de emenda à Constituição, PEC, de seu interesse. O texto aprovado é uma emenda dos deputados Rogério Rosso, PSD-DF e Andre Moura, PSC-SE, à proposta de emenda à Constituição da maioridade penal (PEC 171/93). Foram 323 votos a favor e 155 contra, em votação em primeiro turno. Os deputados precisam ainda analisar a matéria em segundo turno. Tanto Cunha quanto a maioria dos deputados que o apoiaram estão se lixando para os problemas sociais do país.
O plano deles foi muito bem arquitetado. Primeiro a mídia golpista exacerba nos noticiários policiais por dois motivos básicos: a busca por audiência que por sua vez atrai mais anunciantes e para gerar um clima de insegurança na população, assim justifica-se aprovar matérias na Câmara como a da redução da maioridade penal.
Nunca vi uma matéria, em qualquer grande meio de comunicação, sobre a recuperação de jovens infratores, fato que deveria merecer destaque visto que este índice é de 80%, ou seja, apenas 20% dos jovens que saem da Fundação Casa voltam a praticar crimes. Eu conversei com inúmeros deputados que votaram favoravelmente à redução e o que mais ouvi foi: "eu sou contra a redução mas as minhas redes sociais bombaram com críticas a não aprovação de ontem", referindo-se a votação da PEC 171 que foi rejeitada no dia 30 de junho.
A conta é fácil de fazer: notícia de crime todo dia + uma sociedade assustada x aprovação da redução da maioridade penal = a sociedade satisfeita, embora enganada que, por sua vez = voto certo para reeleição.
Cunha já deixou claro que pretende acabar com o Sistema Único de Saúde, SUS, obviamente para beneficiar a medicina privada. Assim como no caso da criminalidade juvenil, as notícias sobre os problemas na saúde pública, são igualmente constantes e quase ininterruptos. Não tenho dúvidas que estão tentando justificar para a sociedade a necessidade de acabar com o SUS.
Para a advogada Lenir Santos, que é Doutora em saúde pública e especialista em direito, "tem sido comum associar as dificuldades da saúde pública com seu financiamento e gestão. Certamente a saúde pública é subfinanciada e tem problemas no desenvolvimento de sua gestão. Mas esta afirmação não pode isolar-se de seus fundamentos. Por que isso acontece?
Países desenvolvidos com saúde universal também sofrem com os seus crescentes custos. Contudo, há uma diferença essencial entre o Brasil e esses países, porque a saúde brasileira é subfinanciada ao contrário dos demais. Basta comparar os gastos públicos da Inglaterra, Canadá, Itália, França com os do Brasil que aplica 3.9% do PIB na saúde pública, enquanto os demais destinam por volta de 7 a 8%. Não há dúvidas de que os crescentes gastos da saúde preocupam a todos, mas certamente países que não consolidaram suas estruturas orçamentárias terão mais dificuldades ainda", disse ela em entrevista coletiva em 2014.
Para ela, não se pode fazer afirmações simplistas sobre esse tema porque ele está intrinsecamente ligado ao direito à vida. Lenir disse ainda que "não é pouca coisa o que se conseguiu estruturar até os dias de hoje no SUS. Muitas são as dificuldades de seus gestores ante uma Administração Pública que vem há mais de vinte anos enfrentando morosidade em sua modernização, o que afeta a saúde pública sobremodo pelas suas especificidades organizativas e seu subfinanciamento crônico. Essas dificuldades nos fazem respeitar mais ainda esses gestores públicos. Afirmar que não faltam recursos é desconhecer a saúde pública; afirmar que falta gestão é desconsiderar o histórico atraso da Administração Pública brasileira e desprezar os esforços realizados pelos gestores públicos com tão pouco dinheiro, sujeitos às pressões do mercado por incorporação de tecnologias e medicamentos, nem sempre de custo-efetividade compatível com o SUS; isso sem falar na judicialização incessante e deletéria ao planejamento da saúde. E não nos esqueçamos dos profissionais que se formam nas escolas públicas para atuação privada". E finalizou afirmando que "o SUS não pode ser esse sistema falido cantado pela mídia. Se assim fosse não seria tão procurado pelos beneficiários de planos de saúde que o querem como complementar aos seus serviços, o que não deixa de ser um dos problemas do SUS: atender beneficiários de operadoras de planos de saúde que abatem do imposto de renda os seus custos e ferem o princípio da igualdade ao atravessar as portas de entrada do sistema".
Cunha não será o presidente da Câmara eternamente, embora eu acredite que ele cultive este sonho, deve deixar o cargo daqui a 1 ano e meio e não me surpreenderia se antes de sua saída ele consiga aprovar o sistema presidencialista, almejando o cargo de Primeiro-ministro.
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