por Juan Ricthelly*
Uma das funções mais básicas do Poder Legislativo é fiscalizar os atos do Poder Executivo, ao menos na teoria, no Distrito Federal a realidade é mais complexa que a teoria.
Temos um sistema político local que possibilita algumas anomalias, que são capazes de confundir funções que são ou deveriam ser exclusivas de Governador e Deputados Distritais, possibilitando por exemplo, que um deputado vire Administrador Regional, sem abrir mão do salário de parlamentar, e saia andando pela cidade com um colete escrito, Deputado-Administrador, abordamos essa situação específica no texto “O Vigésimo Quinto Deputado”[1].
Chamamos esse sistema de Feudalismo Distrital, e lamentavelmente todos os governos que tivemos até hoje, se beneficiaram dele de alguma maneira, tendo em vista que tão poucos esforços foram feitos para garantir a participação da população no processo de escolha dos Administradores Regionais, e isso não é por acaso.
Quando um governador é eleito, normalmente precisa formar uma base para realizar o seu programa de governo, e isso não é de graça, além dos custos que a população paga para manter um deputado, governador também precisa desembolsar alguma coisa para ter apoio, normalmente alguma secretaria, alguns cargos comissionados avulsos pela estrutura do GDF, ou na melhor das hipóteses, alguma Administração Regional.
E Administrações Regionais são moedas de troca diferenciadas, pois com ela, vem o território que ela envolve, a população que nele vive, a publicidade gratuita que obras realizadas pelo Executivo traz e a possibilidade de ter um escape para a execução de emendas parlamentares priorizadas sem a inconveniência de ter o recurso barrado por algum “coronel” local.
No Feudalismo Distrital, o Governador se converte numa figura equivalente ao suserano dos tempos medievais, e os deputados de sua base, em verdadeiros vassalos, que devem apoio incondicional ao governo, caso contrário podem sofrer retaliações, como a perda de seu feudo.
Com esse sistema, o governador tem uma base de apoio, e o deputado ganha uma base material para preparar a sua próxima eleição, oferecendo cargos comissionados na Administração Regional para seus apoiadores (vassalos do vassalo), se promovendo com qualquer coisa feita pelo Executivo na cidade e tendo as suas emendas priorizadas, já que a administração é sua e a cidade se converte em seu curral eleitoral.
Isso possibilita por exemplo, que uma cidade como o Gama, em menos de dois anos de governo, já tenha tido 4 administradores regionais, sem a participação da comunidade, um número infeliz, que combina com a quantidade de partidos por onde o ex-administrador e atual deputado já passou durante o mesmo período (PRP, PSL, PSDB e PL), será que é algum álbum de figurinha?
Entender como esse sistema funciona, facilita bastante compreender algumas decisões tomadas por alguns deputados, se você verifica um recuo aparentemente inexplicável de algum parlamentar, basta se perguntar: o que ele teria a perder, se não voltasse atrás?
Diante disso, esse é um contexto que nos faz questionar, o que está por traz da decisão do Deputado Daniel Donizet, que se reivindica como deputado do Gama, retirar a sua assinatura da CPI da PANDEMIA, inviabilizando que a mesma ocorra por falta de assinaturas suficientes, 13 eram necessárias, agora temos 12.
Não é segredo para quem acompanha a política da cidade, que o deputado, ex-Administrador Deputado, controla a Administração Regional do Gama. Será que isso tem alguma relação com seu recuo?
O argumento utilizado pelo parlamentar, é que defende uma investigação mais ampla, por meio de uma cortina de fumaça, chamada CPI da SAÚDE, que pretende investigar supostas irregularidades que teriam se iniciado no penúltimo governo, passando pelo anterior e chegando no atual.
Segundo ele, por meio de um áudio que circulou com divulgação de seus cabos eleitorais pelos grupos da cidade, “tem que investigar tudo”, legal deputado, também acho que tem.
Mas convenhamos, que é muito oportuno enterrar uma CPI, que estava trazendo um desgaste político ao governo atual, onde coincidentemente se tem um quinhão importante.
Além de sommelier de partido político, agora virou Coveiro de CPI, continue assim a população agradece.
[1] https://www.gamalivre.com.br/2019/06/o-vigesimo-quinto-deputado_10.html?m=1
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*Juan Ricthelly
Advogado, ambientalista, inquieto líder comunitário no Gama.
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