21 de set. de 2016

Proposta de Temer para ensino médio deverá repetir fórmula fracassada de FHC

Ocupações das escolas pelos secundaristas já antecipavam
má qualidade do ensino refletido nos resultados do Ideb
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Proposta de Temer para ensino médio deverá repetir fórmula fracassada de FHC
Para especialistas, reforma vai empobrecer a formação sem corrigir distorções trazidas por políticas educacionais neoliberais fracassadas, como a promoção automática no ensino fundamental

por Cida de Oliveira, da RBA

São Paulo – A proposta de reforma do ensino médio que o governo de Michel Temer deve enviar ao Congresso nos próximos dias, em forma de medida provisória, tem tudo para repetir fórmulas fracassadas dos tempos do governo Fernando Henrique Cardoso, baseadas no empobrecimento da formação para baratear os custos. Esta é a expectativa do professor do Departamento de Educação do campus de Assis da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Carlos da Fonseca Brandão.

"Não dá para saber ao certo o que estará no projeto de reforma. Mas a julgar pela configuração do Ministério da Educação, com pessoas que foram chave nas políticas educacionais dos anos FHC, e com os projetos de corte nas áreas sociais, não se pode esperar algo diferente", diz o professor.

No início de setembro, logo após a divulgação dos resultados da edição 2015 do Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), no qual o ensino médio da rede pública não atingiu a meta estipulada de 4,3, ficando em 3,7, o ministro Mendonça Filho anunciou reformas. E a secretária executiva do MEC, Maria Helena Guimarães Castro, afirmou que o governo defende a flexibilização curricular, dividida por áreas do conhecimento, com um ano e meio de disciplinas comuns e o restante opcional, voltado ao mundo do trabalho. E aposta também no ensino de tempo integral. Maria Helena integrou a equipe de FHC e de governos estaduais tucanos, inclusive São Paulo.

Promoção automática
Para Brandão, o mau desempenho dos alunos no ensino médio é um dos frutos da promoção automática no ensino fundamental, em que os alunos eram aprovados mesmo sem o domínio da escrita, da linguagem e dos cálculos elementares. "Para cumprir metas estabelecidas pelo Banco Mundial, os governos neoliberais do PSDB enxugaram recursos para o ensino. O resultado é que temos hoje jovens no ensino médio que não foram alfabetizados adequadamente, que não tiveram base para a continuidade dos estudos e não assimilaram o que é básico para a compreensão de muito do que é necessário dominar no ensino médio. O que ele vai fazer na escola se nada compreende?", questiona.

"Não há solução mágica. Qualquer experiência de escola bem sucedida mostra o que tem numa escola de qualidade. São professores com vínculo com a escola e a comunidade, que são fixos, onde a direção é ativa. Não precisa inventar a roda. Não há solução mágica para além disso."

Defensor do ensino em tempo integral, o professor da Unesp entende que não basta manter os alunos o dia todo na escola. "As atividades do contraturno não podem ser desconectadas; não pode ser considerado ensino em tempo integral quando o contraturno inteiro é voltado para prática esportiva. Agora, ensino integral custa dinheiro. Como oferecer esse tipo de ensino sem recursos?"

Em reportagem publicada na última sexta-feira (17) na página da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisas em Educação (Anped), especialistas também criticaram as propostas que a equipe de Temer tem antecipado.

Flexibilização
O professor no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) Dante Henrique Moura afirmou que flexibilização está relacionada ao objetivo de baratear o ensino público, comprometendo a educação das classes mais empobrecidas do país. “Os que ocupam posição mais privilegiada na hierarquia socioeconômica nunca se submeteram nem se submeterão aos limites das reformas educacionais, como foi no caso da reforma promovida pela Lei n. 5.692/1971.”

Moura demonstrou ainda preocupação com a dualidade estrutural do sistema acadêmico a partir da separação obrigatória do ensino médio e do ensino profissionalizante técnico de nível médio, resultado da PL 5.115/2013. “A proposta avança ainda mais, porque além de manter a vinculação do prosseguimento de estudos em nível superior à área do curso técnico cursado, restringe o acesso apenas aos cursos de graduação tecnológica, proibindo que os concluintes de cursos técnicos ingressem em cursos de licenciatura ou de bacharelado. Por esse aspecto, o retrocesso é, no mínimo, aos anos 1940.”

Professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e 1º secretário da Anped, Paulo Carrano afirmou que o governo usa como desculpa o resultado baixo, que já era esperado devido às condições das escolas. "Na verdade, ao querer resolver o problema por decreto, sinaliza, mais uma vez, o caráter autoritário do governo Temer. Uma MP exemplifica a ausência de legitimidade política dos que chegaram ao poder sem o voto popular.” Pelo que tem sido dito à imprensa, a proposta consiste de flexibilização do ensino médio com todos os alunos cursando disciplinas em comum por um ano e meio, optando depois por áreas específicas do conhecimento ou seguindo pelo ensino técnico profissionalizante.

Maria Helena Guimarães Castro afirma que a maioria dos alunos sai da escola porque não vê sentido nela. “É preciso renovar as práticas pedagógicas em sala de aula, de modo que os professores trabalhem tanto conhecimentos gerais quanto habilidades socioemocionais. Os alunos precisam ter acesso às novas tecnologias, porque a escola de ensino médio se tornou monótona, desagradável. Não faz sentido para o jovem digital, conectado o tempo todo. Ele não tem paciência para uma aula expositiva de um conteúdo que muitas vezes não faz sentido para ele.”

Carrano, que acompanhou os movimentos de ocupações das escolas por alunos em defesa de ensino de qualidade, lembrou que o jovem expõe a falta de envolvimento e diálogo nas escolas. “De fato, o ensino médio precisa de uma profunda transformação, mas em diálogo com as experiências e expectativas de estudantes e professores que produzem os cotidianos das escolas.”

Com informações da Anped

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