Escorpião capturado em Porto Alegre pela SMS. Foto: Cristine Rochol/PMPA |
Com infestação de escorpião amarelo, Porto Alegre tem apenas uma bióloga em centro de vigilância
por Giovana Fleckno Sul 21
Em 2001, o primeiro escorpião amarelo de que se tem registro em Porto Alegre apareceu na Ceasa (Centrais de Abastecimento do Rio Grande do Sul), no bairro Anchieta. A espécie, no entanto, é originária de Minas Gerais. Segundo a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), a teoria mais provável é de que o animal tenha sido trazido em caminhões de hortifrutigranjeiros vindos do Sudeste para abastecer a Ceasa. O escorpião se reproduz em ambientes frescos e escuros; como frestas de paredes, entulhos, pedaços de madeira, e, inclusive, caixas de legumes ou frutas.
Desde então, os focos de infestação do escorpião só cresceram. Além da região do bairro Anchieta, ele já foi avistado nos bairros São Geraldo e Passo D’Areia e, com maior incidência, na Lomba do Pinheiro e no Centro Histórico. Uma das principais características da espécie é sua reprodução por partenogênese. Nos escorpiões, a fêmea é vivípara – carrega os ovos fertilizados dentro do seu corpo. Assim, cada fêmea coloca uma média de 20 ovos duas vezes ao ano. Por isso, mesmo que apenas um seja visto, já indica que há mais escorpiões na área.
Cientificamente conhecido como Tityus serrulatus, o escorpião amarelo é considerado uma das espécies mais perigosas para os seres humanos no Brasil. Sua peçonha induz resposta inflamatória local e sistêmica. Crianças de 0 a 14 anos correspondem ao principal grupo de risco, seguidas por idosos e pessoas com baixa imunidade. Em 97% dos casos, não é letal. Porém, pela possibilidade de alta incidência, a mera aparição do animal já caracteriza problema de saúde pública.
No entanto, a área de Vigilância em Saúde (CGVS) conta com apenas uma bióloga em atuação. Fabiana Ninov trabalha no setor desde que, em 2016, a vigilância municipal assumiu casos de acidentes com animais peçonhentos. Antes disso, essa era uma atribuição do Estado. Ao longo dos últimos anos, Fabiana passou a capacitar técnicos para que pudessem orientar a população e realizar a captura do escorpião; algo que, antes, cabia apenas a ela. Mesmo tento capacitado 100 pessoas, a demanda da cidade de mais de 1 milhão e 400 mil habitantes faz com que denúncias tenham que aguardar um ou dois dias até a confirmação. “Para que se faça a coleta, tem que haver a confirmação de que é um escorpião amarelo antes de tudo”, explica. Trinta e cinco escorpiões já foram avistados na Capital neste ano. Até o momento, não há registros de pessoas picadas em Porto Alegre. Em 2016, houve três casos, e, em 2017, cinco, de acordo com a SMS.
Dados sobre o escorpionismo em Porto Alegre. O escorpião preto, mais comum, apresenta veneno pouco prejudicial, ao contrário do amarelo – de menor incidência e possivelmente letal. Fonte: SMS/POA
Questão de saúde pública
No Brasil, já foram registrados mais de 24 mil casos; desses, 143 óbitos. “No estado de São Paulo, em maio, morreu uma criança por mês vítima do escorpião”, afirma Fabiana. Nenhuma morte foi registrada no Rio Grande do Sul até o momento. Fabiana afirma que isso se dá pela política de prevenção realizada nos últimos anos. “Nos empenhamos em orientar a população. Além disso, percebemos que, mesmo que o aconselhável seja encaminhar a pessoa picada ao HPS, muitos recorriam aos postos de saúde num primeiro momento. Por isso, capacitei enfermeiras para que elas reconhecessem os sintomas e a necessidade de encaminhar o paciente para o soro”, explica.
Em Porto Alegre, um alerta foi emitido no dia 9 de novembro de 2017 quanto ao risco de proliferação do escorpião. A orientação é que, ao avistar um escorpião amarelo, a pessoa ligue para o número 156 e reporte o ocorrido. Quando está em uma residência, é sinal de que está à procura de seu principal alimento: baratas. Ele apenas ataca em situações de ameaça, por isso, a orientação é evitar o contato.
Em caso de picada, deve-se lavar o local atingido com água e sabão e encaminhar o paciente diretamente para o Hospital de Pronto Socorro (HPS), único dispositivo municipal que possui estoque de soro específico. Assim como o soro antiofídico, o soro com a peçonha do escorpião é feito a partir de coleta local. “As amostras são enviadas e o soro produzido no Instituto Butantan (centro de pesquisa biológica em São Paulo)”, diz Fabiana.
A picada não é visível, mas a dor local é intensa, segundo a bióloga. “O principal sintoma é a dor abundante, que começa no local da picada e se espalha para o corpo todo. O veneno é neurotóxico, é insuportável. Ainda assim, varia de pessoa para pessoa. Alguns aguentam horas antes de chamar o socorro, outros desmaiam na hora”, relata. Em crianças, os sintomas vêm de forma muito mais rápida, podendo evoluir para náusea, vômito e taquicardia em questão de horas. Em outubro de 2017, uma criança de cinco anos ficou três dias na UTI do HPS depois de ser picada por um escorpião amarelo, no bairro Lomba do Pinheiro.
Fabiana reconhece que o empenho em informar e atender às demandas da população é grande. Diversos grupos de capacitação seguem sendo formados, especialmente para atender áreas de risco. Além disso, um portal foi criado para dar conta de reunir toda informação e orientação sobre o animal. Ainda assim, segundo ela, haveria demanda para ao menos mais 10 biólogos, considerando o tamanho da população e a possibilidade de capacitação de novos técnicos e profissionais de outras áreas.
A última chamada registrada em Porto Alegre, até o fechamento desta reportagem, foi realizada no Centro Histórico, na quinta-feira (7). A SMS foi procurada para responder sobre contratações referentes à área de Vigilância em Saúde, mas não retornou o contato.
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