9 de dez. de 2014

Guri Vintage - por Iberê Lopes

Foto: Richard Silva 
Eu acordo de bom humor, ligo o som em volumes aceitáveis, danço espalhando água no banheiro e canto no chuveiro acompanhando a letra. 
Demoro para escolher a roupa, pois são cores que devem imprimir meu estado de espírito. Nada me faz sair sem antes agradecer aos deuses afro-brasileiros o dia que vou encarar. 

Algumas frutas tem gosto de despertar: pera e morangos com mel farão parte da mesa matinal. Acendo um incenso, vou até a sacada e ouço os pássaros anunciando a lida. Me corrija se estiver errado ou sou de outro mundo. Se quiser, pode mostrar outra perspectiva além da rotina representada aqui. Mas já aviso, essa dinâmica vai mudar independente das estações do ano. Assim como os móveis, quadros e gostos também serão alterados assim sem uma razão evidente. Tenho ciclos de três meses para tudo quanto há. 

Escuto rock nas alturas e sertanejo baixinho. O local dos livros, discos e dvd´s é um templo. Sagrado feito as estrelas. Justamente por brilharem muito. O que não será alvo de inconvenientes mudanças: o pôster do Pearl Jam na parede, a fé no futuro e a crença na vitória do socialismo. Dias de tristeza, desconsolo e noites de chuva com filmes românticos ou revisitas aos clássicos de Chaplin haverão. Nada que perdure ou seja perpetuado. Saio por aí de bicicleta, num domingo de sol e tudo se renova. 

Futebol não me interessa, só quando quero desligar de tudo. Assisto qualquer partida só pela arte das jogadas. Pulo poças d'água feito criança de maneira incansável. Menino, ao mesmo passo homem. 

Antes de dormir escrevo uma ou duas histórias que rondaram meu pensamento. E por lembrar disso, as poesias. Não posso esquecer de falar delas. Parte importante de todas as horas, assim como as canções. Elas perpassam e permeiam cada detalhe, passo ou instante. Acho que três em um espaço de uma semana é a média. Nem conto direito para não tolher minha criatividade. Terei a incapacidade de dormir com alguma letra de música, acorde ou verdade para dizer entalando meu sono. Gosto de sonhar e para isso as vias precisam estar desobstruídas. 

Aprendi que discutir relação em excesso enche o saco. Porém, deitar ao lado de quem eu amo de cara amarrada nunca será uma realidade. Uma noite mal dormida por um desentendimento reflete num amanhã de tropeços e desânimo. Eu pergunto como foi o dia e gosto de ser perguntado, respeitando os momentos de silêncio. 

Vinho é indispensável e harmoniza super bem na hora de fazer amor ou contar segredos à meia luz. Surpresas, flores, presentes e beijos sem data marcada são fundamentais. 

Sou independente, impulsivo, amo cinema europeu, latino-americano e documentários sobre os rumos da humanidade. Cafuné alternado, colo quando preciso e muito carinho. Ninguém é pegajoso quando está apaixonado, isso significa entrega. Assim como brigadeiro, a melhor parte é raspar a panela. Para resumir, o toque e o gesto de afeto jamais serão em demasia. A única coisa que fica horrível quando gruda é cola-tudo. Aprecio a liberdade no estado complexo e completo da palavra. Ao imaginar prender e controlar minha vidinha a criatura já me perdeu sem perceber. 

Pipoca feita com duas gotas de dendê e suco de caju. Temperos, perfumes e cheiros pela casa inteira. Incensos à noite também deixarão o lar em perfeita sintonia com o universo. Depois de alinhados os planetas em aquário a gente dança de rosto colado e se ajeita no tapete da sala.

Por fim, numa noite dessas pedi licença à uma amiga muito especial e fiz algumas perguntas que despertaram, numa espécie de divã virtual, este texto. De acordo com a pesquisa sou tranquilo de conviver, observada a margem de erro conforme a proximidade do objeto. Neste caso o objeto sou eu. 

Não sou chato, sou inteligente e tenho qualidades. Informado e sensível, podemos conversar de tudo um pouco tranquilamente. Tenho um estilo alternativo de vestir, grunge cool. A inconstância é um ótimo atributo para evitar a rotina. Pareço um rapaz sério. Sobre ser só, ela me disse que todo o mundo é um tanto ou muito assim. 

O restante se resolve vivendo. Terapia semanal, garrafas de cabernet, orações diárias, amar incondicionalmente são as receitas exatas. E quando tudo parecer perdido caneta e papel na mão, nos versos me refaço e recomeço. É, diante disso posso me definir como um guri vintage, de coração aberto e horizonte claro. É hora de me compartilhar antes que o tempo vire. 

Guri Vintage - por Iberê Lopes 08/12/2014
Foto: Richard Silva 

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