16 de ago. de 2016

Já que não sai nos jornalões, publica-se na aldeia…

O golpe de Estado impetrado contra a democracia brasileira segue sua encenação teatral aos olhos mais acurados. 
Há 50 anos, pela via da violência e das armas; hoje por caminhos mais sutis, mas igualmente tortuosos, dos nossos Poderes Legislativo e Judiciário.

por *Volnei Garrafa
em pcdobdf.blog.br

Exatamente como a deposição, no Paraguai, há pouco tempo, do então eleito presidente Fernando Lugo. Lá, em poucas horas, como uma punhalada certeira no coração da frágil estrutura política daquele sofrido país. Aqui, em doses homeopáticas, mas igualmente letais, levando o “gigante adormecido pela própria natureza” e sua trôpega democracia a uma agônica situação por vários meses, de modo a aparentar “legalidade”. Após ouvir e assistir, na semana passada, os discursos das senadoras Vanessa Grazziotin e Gleide Hoffman proferidos no Congresso Nacional, fiquei pasmo, entre a raiva e a pena, esta última, da imagem acabrunhada do Ministro Ricardo Lewandowski, sentado na honrosa cadeira de comandante da encenação.

O constrangimento do magistrado era flagrante. Teatro irreal, responsável por um desgaste histórico internacional de proporções futuras inimagináveis. Que o digam jornais insuspeitos como o El País (Espanha), Le Monde (França), New York Times (Estados Unidos), La Repubblica (Itália)… Viu-se ali, incomodamente sentada, a imagem simbólica de um tribunal superior e supremo, com a arrogância dos seres superiores pretensamente iluminados, mas anos-luz distanciados das classes historicamente alijadas do poder de decisão.

Um tribunal jurídico público estranhamente silencioso frente a podridão legislativa que transformou uma denúncia técnica e comprovadamente vazia,  em um vil ato político de impedimento, que rouba a decisão democrática de mais de 54 milhões de votos/cidadãos sufragados nas eleições de 2014.

Em um processo eleitoral limpo que ascendeu uma mulher, pela vez primeira, ao cargo maior de Presidente da República. O grotesco senador Aécio Neves e sua trupe, desde o primeiro dia pós-derrota, que desta vez as elites nacionais realmente não esperavam, começaram a urdir o golpe.

A democracia no Brasil – em mais uma oportunidade após o deplorável golpe de 31 de março de 1964 – foi enlameada, retornando, para nossa vergonha, ao “seleto” grupo dos “países bananeiros” da América Latina. Foi pisoteada, pelo ato brutal de 1964, executado contra Jango Goulart e suas “perigosas” reformas estruturais, pelas armas bélicas de militares autointitulados de “nacionalistas”, obviamente de direita, apoiados por civis também direitistas e igualmente golpistas.

Hoje, a farsa é retomada nesse escandaloso ano 2016, por atos sucessivos de deputados e senadores com as mãos notoriamente sujas, que protelam interminavelmente a cassação de Eduardo Cunha e que estão indiciados em centenas de ações públicas, infelizmente sustentados por decisões de um Judiciário acabrunhado, mas falastrão, que deveria ser o respeitável órgão público mais neutro e discreto do país…

Declaro-me, então, um cidadão brasileiro envergonhado com nossos prematuramente envelhecidos poderes públicos, e com um persistente enjoo frente a todo esse teatro do absurdo que continua acontecendo em pleno século 21. Em um país que já chegou a ser a 6a. economia do planeta e que logrou recentemente a proeza de, em poucos anos, tirar 35 milhões de cidadãos da pobreza. Registra-se, assim, mais um avanço ao passado nesta pobre/rica nação, onde as elites econômicas – com apoio escandaloso de uma imprensa comprometida e apodrecida, perceptível mesmo a cérebros medianamente desenvolvidos – continuam manipulando sua atrasada classe média, em prejuízo direto das pessoas mais pobres.                                                                                  

*Volnei Garrafa, Professor Titular de Bioética da Universidade de Brasília – Filiado ao PCdoB

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