13 de set. de 2019

Como Franz Kafka pode contribuir com o Direito contemporâneo?

“Tudo o que não é literatura me aborrece”. Essa frase, uma de suas mais famosas, demonstra a obstinação do escritor tcheco Franz Kafka pela literatura.

Esse afinco, que o acompanhou até os últimos dias de vida, fora determinante para que viesse a se situar como um dos literatas mais lidos da literatura alemã moderna, o que, em alguma medida, é surpreendente, já que quando morrera, um mês antes de completar 41 anos, em decorrência de uma tuberculose pulmonar que o atormentara desde os 34, era um autor quase desconhecido. Certo é que Kafka, ao se valer de um narrador não consciente ou insciente, que tanto sabe como o personagem e o leitor, leva este último à reflexão sobre o universo alienado em que todos vivemos.[1]

Embora se pense, a priori, que o literata tenha sido um forjador de mitos ou simbolista, sendo sua ficção pautada por um mundo sobrenatural ou místico, o escritor, na verdade, costumava escrever a partir da experiência, sendo a realidade seu objeto, o que levou Modesto, inclusive, a descrevê-lo como sendo um fabulador realista.

Se, porém, aparentemente, tenha-se a impressão de que seja sua arte “metafísica”, como aduz Adorno, a culpa não parece ser dela, mas sim do universo de onde ela se deriva. Com efeito, o estranhamento dos escritos de Kafka e o seu método para nos conscientizar da alienação não é, como parecer ser, um truque ou estilística, mas, ao contrário, um fenômeno do mundo moderno, que fica encoberto pela vida cotidiana, mas que se desencobre pela escrita kafkiana. Talvez, não por outro motivo, Anders disse outrora que “o espantoso, em Kafka, é que o espantoso não espanta ninguém”; e que “o mais inquietante é que não são os objetos nem as ocorrências como tais, mas o fato de que seus personagens reagem a eles descontraidamente, como se estivessem diante de objetos e acontecimentos normais”.[2]

Embora formado em Direito, Kafka não escrevia diretamente para juristas, o que não o impede de contribuir para uma compreensão mais crítica da ciência jurídica, sobretudo no que se refere à realidade pela qual o Direito objetiva regular.

 Em tempos atuais, premissas consideradas como absolutas até não muito tempo passam a ser questionadas, chegando, em casos mais radicais, a serem rejeitadas por completo. Como exemplo, tem-se as discussões sobre o aspecto físico e a rejeição do formato esférico da Terra, a eficácia das vacinas, a ideologia política associada ao Partido Nazista, o aquecimento global e a própria credibilidade dos estudiosos e especialistas, encontradas sem muito esforço no âmbito das mídias sociais.

Por Samuel Justino de Moraes no Justificando

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