16 de nov. de 2016

Pai mata seu próprio filho por discordar de seus ideais

Guilherme foi vítima de intolerância de seu próprio pai
Foto reprodução/Facebook
Intolerância: Pai mata seu próprio filho por discordar de seus ideais
A intolerância extrema vitimou um jovem estudante de matemática da Universidade Federal de Goiás (UFG) de apenas 20 anos, Guilherme Silva Neto. O assassino, o seu próprio pai, o engenheiro civil Alexandre José da Silva Neto, de 60 anos que após cometer o crime, suicidou com um tiro na boca e morreu logo depois no hospital. A tragédia ocorreu nesta terça-feira (15), em Goiânia-GO.

Segundo relatos da mãe, a delegada aposentada Rosária de Moura Sousa e Silva, pai e filho viviam em conflito. O pai não aceitava o ideal revolucionário do filho que simpatizava com o modo alternativo de vida e às lutas sociais que participava. 

Para o delegado do caso o crime foi premeditado. Segundo a ocorrência, os dois discutiram pela manhã e o pai havia proibido o filho de se encontrar com colegas que participavam da “ocupação” na universidade. À tarde, Alexandre saiu de casa e ficou à espreita do filho, Guilherme, que logo também saiu de casa e foi perseguido pelo engenheiro civil com uma arma na mão. O pai efetuou vários disparos contra o jovem até matá-lo e depois atirou contra sua própria vida.

Caráter político
Segundo o professor de História da UFG, Rafael Saddi, que conhecia o jovem e compartilhava dos mesmos ideais do estudante, o crime não deve ser tratado somente como uma violência familiar, teve um caráter político e deve ser analisado. 

“O mais baixo uso político de uma tragédia é aquele que tenta impedir a explicitação do caráter político desta tragédia, disfarçando-se de humanismo”. Para Rafael, “é evidente que nem todo mundo que é contra as ocupações é capaz de matar por isso. Precisa de um traço profundamente violento e sabe-se lá mais o quê para cometer tal barbaridade. Mas, sim, a motivação política existe, está aí, para todos verem”, postou inconformado. 

“O Guilherme está morto. Um jovem que tinha o melhor da juventude: sua indignação, sua coragem e seu idealismo. Para quem conheceu o Guilherme, não era possível separar sua vida de suas ideias. Tampouco, poderão separar sua morte. Enxuguem o choro, que ele não nos engana. Não Passarão!”, afirmou o professor.

Movimento estudantil e as ocupações
Guilherme Irish (irlandês), era o nome que o estudante usava nas redes sociais. Em várias de suas postagens ele mencionava o movimento estudantil e a luta que participava, sejam nos atos, manifestações e mais recentemente nas ocupações nas escolas e universidades. 

O movimento estudantil criou grande impacto na luta social ao ocupar nos últimos meses mais de mil escolas, cerca de 200 universidades e institutos de educação no país contra o retrocesso marcado pelas medidas de austeridades do governo de Michel Temer que propõe reformas como a PEC 55 (em tramitação no Senado) que reduz drasticamente o financiamento público para a Educação e Saúde pelos próximos 20 anos.

Para as entidades estudantis, a ocupação é a forma encontrada de lutar pelos investimentos na educação pública brasileira.

Muitos professores, técnicos administrativos e pais de alunos apoiam a luta dos estudantes nestas ocupações, em muitas universidades o calendário escolar deste ano está marcado por greves e paralisações na jornada de luta dos estudantes e trabalhadores do ensino contra o retrocesso na Educação. Uma das apoiadoras deste movimento é a professora e Conselheira Estadual da Educação de Goiás, Ailma Maria de Oliveira, que também conhecia o jovem assassinado. 

Sentida com a crueldade do caso, Ailma Maria que também é sindicalista, presidenta estadual da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) disse que viu o garoto em diversos atos em defesa da educação. 

Para ela, as ocupações “fazem a luta da resistência contra o golpe, contra o fascismo, contra o autoritarismo, contra os que se apropriam da liberdade da juventude de lutar, de resistir, de sonhar e, de reinventar um outro modelo de sociedade”.

“O pai do Guilherme deveria ter ido as ocupações. Deveria conhecer os amigos, as intenções, deveria ter vivido e, deveria principalmente tê-lo deixado viver”, disse, chocada com a violência.

Preconceito, intolerância e violência
Essa tragédia familiar conjectura sob um cenário de intolerância e ódio extremos, numa sociedade cada dia mais doente, que não consegue aceitar e conviver com as diferenças. Infelizmente, o jovem rapaz morto não foi o único que teve sua vida covardemente ceifada no meio desse quadro de intolerâncias. 

Várias pessoas são vítimas de preconceito, ódio e intolerância no Brasil e no mundo. E estes traços estão diretamente ligados à uma cultura da não aceitação do outro. Contidas em mensagens racistas, homofóbicas, machistas, misóginas e que ocasionam em inúmeras vítimas.

O respeito às escolhas de cada um de nós sobre seu modo de vida, sua religião ou posição política, seja sua opção sexual e até mesmo o time de futebol de coração é determinante para tirar da sociedade essa “tradição” intolerante. 

A diversidade deve ser respeitada, devemos considerar a opinião de cada cidadão. A cultura da paz deve ser cultivada por toda a sociedade, ela deve estar inserida na vida escolar, na família, na igreja, no trabalho, nas ruas. Esse quadro de intolerância deve ser quebrado com o debate, com a abertura, com o entendimento que só o respeito ao outro nos trará a paz. O respeito, sobretudo, pela vida humana, poderá salvar a vida dos nossos filhos e não tirá-las.


Do Portal Vermelho, Eliz Brandão

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